No meio de todas as notícias políticas e policiais envolvendo corrupção, julgamento, prisão de autoridades públicas, idas e vindas da reforma da Previdência, uma triste matéria publicada no G1 na manhã desta quarta-feira (13) apresenta um retrato dos nossos tempos. Aconteceu em Itatiba, uma cidade com pouco mais de 100 mil habitantes, localizada em São Paulo, na região de Campinas, a 80 quilômetros da capital do Estado. Segundo a notícia, Papai Noel foi apedrejado por lá. Isso mesmo: o Bom Velhinho foi recebido a pedradas por crianças da periferia da cidade.
As pedradas vieram quando as crianças perceberam que o Papai Noel não tinha mais balas para distribuir. Há uma tradição em Itatiba, de voluntários que se vestem de Papai Noel e visitam bairros da periferia pobre da cidade. Esse voluntário se queixa que tem sido recebido agora assim. Numa singela tentativa de não interromper sua atividade, o Papai Noel voluntário está pedindo à comunidade que doe mais balas.
Mas o que impressiona na reportagem é a reação violenta das crianças. Num Natal comercializado, onde a ideia de fraternidade é resumida a dar e receber presentes, a figura do Papai Noel talvez gere junto às crianças carentes mais um espírito de frustração que de fraternidade. Uma festa da qual muitas vezes elas talvez não participem.
Mas isso não é nenhuma novidade. Os shopping centers todos os anos entoam uma canção de Assis Valente, cuja letra tristíssima passa despercebida da maioria dos consumidores. É uma canção da década de 1940, onde ele já falava de alguém que deixava um pedido ao Papai Noel e não era atendido. “Já faz tempo que eu pedi/Mas o meu Papai Noel não vem/Com certeza já morreu/Ou então felicidade é um brinquedo que não tem”. Assis Valente suicidou-se em 1958, tomando formicida.
Neste nosso país desigual, o Natal, portanto, como mostrava Assis Valente, sempre foi negado à infância mais pobre. Mas não há muito registro de que essas crianças reagissem a isso jogando pedras no Papai Noel…
Insuficiente ou não, eleitoreiro ou não, com condições ou não de ter se tornado permanente, iludidos ou não por uma política pouco responsável de crédito facilitado, as populações mais pobres experimentaram um período de ascensão social por um período. Não enxergam mais isso, e hoje já experimentam ou temem fortemente o retrocesso. Num país em tempos de ódio exacerbados por um discurso político que alimenta ainda mais essa divisão entre ricos e pobres, entre coxinhas e mortadelas, entre tucanos e petralhas.
No meio disso tudo, as pedras sobram para o Bom Velhinho…