Nosso modelo de presidencialismo de coalizão é mais uma das jabuticabas azedas que vez por outra insistimos em inventar por aqui. O Brasil tem nada menos que 35 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). E outros 34 esperando registro. Vinte e oito têm representação no Congresso Nacional. Não há nada sequer parecido no mundo. A pulverização de partidos políticos – a maioria sem grande consistência ideológica – faz com que os governos precisem formar sempre bases de sustentação com mais de uma dezena de partidos aliados. Que estão longe de aderir por qualquer tipo de afinidade com as propostas e programas dos governos. Mas porque aderir significa o atendimento de seus interesses particulares. Cargos, verbas, nacos de poder…
O resultado disso é que a regra básica de convivência entre Legislativo e Executivo no Brasil passa a ser “criar dificuldade para vender facilidade”. Não é por acaso que o país parece viver quase sempre em crise permanente. Nesse modelo de necessidade de buscar votos num cenário partidário pulverizado, não interessa ao Congresso criar para o governo um ambiente de facilidade, de apoio simples e inconteste. Quanto mais difícil parecer a obtenção do apoio, mais caro para o governo esse apoio fica, mais lucrativo fica para cada um dos partidos na negociação. Em tempos de crise como os nossos, a regra se agudiza.
É o que acontece no momento. O presidente Michel Temer corre atrás de apoio para tentar evitar a aprovação na Câmara do pedido do Ministério Público de autorização para a instauração de processo contra ele em consequência das denúncias feitas por Joesley Batista. O Ministério Público acusa Temer de corrupção passiva. A Câmara tem de dar a autorização para que o processo corra. É necessária a maioria dos votos dos deputados.
A essa altura, praticamente todos os jornais do país já tentaram fazer um levantamento da tendência dos deputados. E todos os que tentaram esbarraram na mesma dificuldade. A grande maioria dos deputados não entrega de jeito nenhum como vai votar. Mesmo o próprio governo não foi ainda capaz de fazer um mapeamento confiável da tendência. Seja no plenário, seja primeiro na Comissão de Constituição e Justiça, onde antes o pedido terá que passar.
O próprio escolhido para relatar o caso, deputado Sergio Sveiter (PMDB-RJ), é a própria encarnação dessa incógnita. Ele é do mesmo partido de Temer. Foi secretário dos ex-governadores do Rio Sergio Cabral e Anthony Garotinho, hoje enrolados nas denúncias. Mas ele mesmo é tido tanto por governistas como oposicionistas como alguém independente. Ou seja: ninguém sabe ao certo o que irá dizer no seu relatório sobre o processo.
Assim, com um relator que ninguém sabe o que fará e a grande maioria dos deputados na moita, o Congresso vai rodando na Bandeira 2, criando para valer as dificuldades para vender caro as facilidades. Levantamento feito pela Agência Reuters mostra que o governo federal liberou R$ 529 milhões em emendas parlamentares e restos a pagar somente no mês de junho. Até maio, o total de dinheiro liberado era R$ 959 milhões. Ou seja, em um mês, o valor total de repasse acumulado pulou para R$ 1,48 bilhão. Diz a Reuters que no início de maio, antes de estourar a denúncia de Joesley, o total acumulado no ano somava R$ 531 milhões. Fica claro como girou o taxímetro do Congresso…