O fim do foro privilegiado, por enquanto um espectro constitucional, escancara a queda de braço entre o Legislativo e o Judiciário. Cobrado pela opinião pública e pressionado pelos juízes da Suprema Corte, o Senado cedeu, aceitando se entregar nas garras de magistrados de menor quilate.
Como a maioria absoluta da Câmara Alta não é composta nem de neófitos, tampouco de pacóvios, os senadores fizeram o dever de casa. Se é para acabar com o privilégio, que valha para todas as autoridades.
Tal como avisou o senador Romero Jucá, de maneira quase vomitiva. “Se acabar o foro, é para todo mundo. Suruba é suruba. Aí é todo mundo na suruba, não uma suruba selecionada”, pregou.
Na ocasião, em fevereiro, as críticas de sempre voltaram-se à linguagem imprópria. Além disso, buscou-se deslegitimar o parlamentar, alvo recorrentemente da Operação Lava-Jato. A essência de sua diatribe, porém, foi desprezada – não por este Os Divergentes.
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Agora, na esteira da votação do Senado, fora do script, virão as ponderações de que “talvez não seja o melhor momento“, caso de Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados. Por sua vez, Gilmar Mendes, o falante juiz do STF, diz que está “desconfiado” dos parlamentares.
Embora dizendo-se defensor de mudanças na chamada prerrogativa de função, Mendes disse temer “as atitudes performáticas, os ativismos, o sensacionalismo“. Ele não falava do STF, mas dos magistrados de primeira instância.
Pareceu esquecer três aspectos. A recorrente lentidão da Corte Máxima para julgar maganos; a tendência de parte de seus integrantes – também juízes e humanos – a estrelismos e vaidades; e o mais importante: a igualdade entre os cidadãos, primordial numa democracia que mereça este nome.
Meliantes do erário que se travestem de parlamentares merecem as barras dos tribunais. Tanto quanto juízes que, eventualmente, vendem sentenças ou mantêm uma garota em cela com presos masculinos.
Confrontar o Congresso equivale, por vezes, a encarar a face pervertida da sociedade. Os parlamentares não chegaram em Brasília a pé. Foram sufragados livremente por eleitores de todos os rincões. Como Jucá, pernambucano eleito quatro vezes senador e uma governador pelo povo de Roraima.
Já juízes e procuradores tendem a se eternizar no serviço público independentemente da opinião dos eleitores. De lá dificilmente saem, a não ser por espontânea vontade ou rumo a generosas aposentadorias.
No caso de juízes, recorde-se que serão eles julgados por seus pares. Os mesmos que, via de regra, sentenciam colegas delinquentes a pena máxima da aposentadoria compulsória, com vencimento integral e plano de saúde.
Não dá pra saber se a Câmara Baixa terá a mesma audácia dos senadores quando, e se, a proposta que acaba com o foro lá chegar. Mas será mais um passo rumo à utópica sociedade igualitária.