Nem que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) fosse o mais isolado laboratório científico do planeta, seria possível a ele agir sem levar em consideração o que acontece do lado de fora. Ninguém haveria de fazer ali processos e misturas que desencadeassem uma reação em cadeia que depois não fosse mais possível de se controlar. Da mesma forma, como o TSE não quer contribuir para a explosão do país, é evidente que não virá de lá uma reação em cadeia nesse sentido. Assim, é claro que o julgamento da chapa Dilma/Temer não será, como diz o presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, somente “jurídico e judicial”. Não há a menor dúvida de que, além das questões jurídicas e judiciais, os ministros levarão em conta as consequências políticas da decisão que vão tomar, seja ela no sentido de absolver ou condenar o presidente Michel Temer.
Na verdade, ao contrário das declarações feitas pelo presidente do TSE, é mais ou menos isso o que estão dizendo reservadamente outros ministros. Eles reconhecem – e nem poderia ser diferente – que o agravamento da crise será levado em conta na decisão que irão tomar. O cenário era um antes do conteúdo da delação premiada do irmão Friboi Joesley Batista. E tornou-se outro depois. Ainda que o conteúdo da delação não faça parte dos autos e não seja exatamente o ponto focal do julgamento, ele será levado em conta ao se definir se Temer tinha ou não tinha conhecimento das irregularidades cometidas nos acertos para o financiamento da sua chapa com Dilma Rousseff. E certamente será considerada a reação da eventual decisão que for tomada.
Como disse Gilmar Mendes, de fato é “normal” num julgamento desse tipo algum dos ministros pedir “vistas”, ou seja, pedir mais tempo para estudar e tomar sua decisão. O que poderá adiar a conclusão do julgamento que se iniciará no dia 6 de junho. Mas, na verdade, esse pedido de vistas poderá acontecer não exatamente para que aquele que o pedir tenha mais tempo para firmar sua convicção. Ele pode acontecer para dar mais tempo à busca de uma solução política.
No momento, o país ainda segue longe de um consenso. Com vários cenários, todos eles cheios de incertezas, em construção. A sociedade – ou pelo menos parte dela – pressiona por eleições diretas. Mas não aponta como essas eleições diretas aconteceriam. O país vai realizar um pleito nacional para eleger um presidente com um mandato tampão até as eleições do ano que vem? Ou vai antecipar essa eleição, ampliando o mandato do próximo presidente? Quanto tempo é necessário para se organizar tal eleição direta? Certamente, mais que os trinta dias previstos para uma eleição indireta. Enquanto essa eleição direta se organiza, o país fica governado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ)? Como e em que tempo se darão as mudanças constitucionais necessárias para tal arranjo?
Se o caminho for seguir o que já prevê a Constituição, após a saída de Temer Rodrigo Maia assume obrigado a convocar eleições indiretas em trinta dias. Para que tal eleição seja de fato a solução para a crise, ela teria de encontrar um nome de consenso que fosse capaz de pacificar minimamente o país até as próximas eleições presidenciais. Esse nome não há. Na verdade, hoje aparecem vários possíveis nomes. Alguns que poderiam participar da disputa. Outros que só poderiam também com mudança constitucional (os casos daqueles que têm incompatibilidade por seus cargos, como a presidente do Supremo Tribunal Federal, Carmem Lúcia).
Evidentemente, dar tempo à busca de uma solução consensual significa também dar tempo ao próprio Temer. Que pode, com esse tempo, reconstruir suas pontes e sair do córner em que se encontra hoje.
Ninguém tem hoje condições de prever o que vai acontecer no TSE. Agora, a única coisa que seguramente não acontecerá ali será um julgamento somente “jurídico e judicial”.