O STF vem dando muitas voltas para ajustar o parafuso democrático. Uma das principais peças individuais de resistência ao fascismo ensaiado pelo capitão tem sido o ministro Alexandre de Moraes. No lance mais recente, diante de “fortes indícios e significativas provas”, abriu uma explosiva investigação para apurar a atuação de uma organização criminosa na internet que atuaria com o nítido propósito de atacar o Estado Democrático de Direito e desestabilizar as instituições.
Trata-se de um produto das investigações sobre atos golpistas, perpetrados entre maio e junho de 2020, quando um grupo de terroristas de ultradireita chegou a atirar fogos sobre o STF. Alguns anões golpistas foram parar na cadeia e hoje são arrependidos.
O ministro Alexandre de Moraes quer, agora, identificar os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro que usaram as estruturas do Palácio do Planalto, da Câmara dos Deputados e do Senado para disseminar informações falsas nas redes sociais e atacar a democracia. A falange criminosa, financiada com dinheiro público, teria por finalidade desestabilizar as instituições, principalmente a Justiça, que tem se contraposto aos atos marginais e golpistas.
A abertura do inquérito se baseia em relatório da Polícia Federal que cita como possíveis envolvidos na quadrilha criminosa três crias do capitão, os numerais Eduardo, Flávio e Carlos Bolsonaro. Também estão na alça de mira Bia Kicis e Carla Zambelli, discípulas desmioladas do Jim Jones escatológico.
No inquérito com potenciais explosivos, Alexandre de Moraes pede que seja analisada “a presença de fortes indícios e significativas provas apontando a existência de uma verdadeira organização criminosa, de forte atuação digital e com núcleos de produção, publicação, financiamento e político absolutamente semelhante àqueles identificados no Inquérito 4.781, com a nítida finalidade de atentar contra a Democracia e o Estado de Direito”. Moraes tem sido o pilar mais irredutível no STF contra as bravatas despóticas do capitão, agora envolvido até o pescoço com a corrupção das vacinas e, quiçá, das rachadinhas.
O inquérito para investigar a provável propina na vacina da Covaxin também foi aberto pela ministra Rosa Weber. Inicialmente pode até blindar um dos principais suspeitos, Francisco Emerson Maximiano na CPI, mas inquéritos são indomáveis. A infantaria bolsonarista já acumula mais de 30 baixas emblemáticas no enfrentamento contra o STF. A mais hemorrágica, que faz o capitão sangrar diariamente há meses, é a CPI da pandemia do Senado Federal. O STF, reafirmando jurisprudência histórica, determinou em 8 de abril de 2021, o funcionamento da CPI que vem nocauteando o governo e expondo as vísceras bolsonaristas mais purulentas da corrupção com vacinas.
Com muito pouco tempo de trabalho, depoimentos devastadores e um horizonte imponderável, a comissão já comprovou a existência de um ministério paralelo, regente de políticas públicas mortais que se resumem em: abuso da cloroquina, boicote às vacinas e o rastro malcheiroso de propina em, pelo menos, 3 aquisições de imunizantes suspeitos. Mas Bolsonaro, em tombos vertiginosos nas pesquisa, diz “cagar” para CPI.
No começo da pandemia, em março de 2020, o ministro Alexandre de Moraes, suspendeu trechos de uma medida provisória tentando flexibilizar a Lei de Acesso à Informação, uma das mais relevantes conquistas democráticas recentes. O governo tentava abolir a obrigatoriedade de órgãos públicos de cumprirem os prazos para responder pedidos via LAI.
Moraes afirmou que a MP pretendia “transformar as exceções – sigilo de informações – em regra, afastando a plena incidência dos princípios da publicidade e da transparência”. Todas as gestões de vocação autoritária reverenciam a opacidade, pregam a mentira e abominam o controle público. Bolsonaro admira mentiras, versões unilaterais, abomina questionamentos, o contraditório e ameaça revidar com “porrada” os interlocutores inconvenientes. Tem uma desenvoltura agressiva em especial com mulheres jornalistas.
Em 8 de abril do ano passado, o ministro Alexandre de Moraes também decidiu que estados e municípios teriam autonomia para decidir sobre isolamentos sociais. Na ação, a OAB pedia para obrigar o presidente a seguir as recomendações da OMS. Para o magistrado, o governo federal não poderia “afastar unilateralmente” decisões de governantes locais sobre a restrição de circulação, cuja eficácia, afirmou o ministro, foi comprovada por diversos estudos científicos.
É contra essa medida que o capitão golpista guerreia até hoje sem nenhuma expectativa de triunfar, revelando-se um péssimo estrategista e masoquista contumaz. Uma semana depois, em 15 de abril de 2020, o STF referendou por unanimidade que estados e municípios têm autonomia para determinar o isolamento social em meio à pandemia do coronavírus.
A maioria da Corte Suprema permitiu ainda que os entes da federação decidam quais são os serviços essenciais que poderiam funcionar durante a crise da Covid-19. Contra essa decisão Bolsonaro sempre ameaça com medidas provisórias, decretos e até colocar nas ruas o Exército, que ele humilha diariamente como vira-latas adestrados. Ao contrário do que argumenta precariamente o capitão, que parece querer uma “Constituição paralela”, a decisão do STF não o impediu de atuar contra a pandemia.
A terceirização, nesse caso, não colou e ele derrete após a criminosa omissão na pandemia. Vai se descobrindo, gradativamente, que além do negacionismo e obscurantismo, o interesse também era financeiro. Todas as vacinas de instituições respeitadas, com compliance e regras rígidas contra corrupção, ficaram meses em banho-maria implorando para vender doses ao governo Bolsonaro. Já os tamboretes desconhecidos e veias abertas para corrupção, sem vinculação com vacinas, encontraram facilidades e prazos recordes.
Alexandre Ramagem, tira da cozinha da família Bolsonaro, foi barrado no comando da PF por Alexandre de Moraes em 29 abril de 2020. A indicação violaria o princípio da impessoalidade e uma tentativa de instrumentalizar a PF e transformá-la em uma Gestapo, a polícia política criada por Adolf Hitler. Bolsonaro queria um comparsa no comando da PF para acessar informações e relatórios confidenciais. Após uma busca e apreensão, também determinada por Alexandre de Moraes, contra aliados o capitão fez ameaças: “acabou porra”.
Depois da quebra de sigilo contra os amigos golpistas, Bolsonaro bravateou novamente o STF: “Está chegando a hora de tudo ser colocado no devido lugar”. Abraham Weintraub, na reunião ministerial de 22/4/2020 resumiu a pontificação nazista: “Por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF”.
Apostando no êxito do golpe, dois recrutas da estrebaria bolsonarista marcharam até a residência do ministro Alexandre de Moraes em 2020. O acampamento fascista para sitiar, intimidar um ministro do Supremo Tribunal Federal e conspirar contra a democracia foi enquadrado e eles, massa de manobra anônima e desprezível, viraram réus e evaporaram. O ex-vice-líder de Bolsonaro na Câmara dos Deputados, Otoni de Paula, foi condenado a indenizar o ministro Alexandre de Moraes em R$ 70 mil por ofendê-lo com palavrões irreproduzíveis.
Alexandre de Moraes também negou o pedido do governo para ampliar a vigência das medidas provisórias durante a pandemia. Moraes determinou ainda, em 9 de junho de 2020, que o governo retomasse a divulgação integral do número de mortes e infectados por Covid-19. À aquela época, como na ditadura, o governo queria ocultar os cadáveres que executara.
A tropa da toga anda eriçando a cavalaria bolsonarista. Após Alexandre abrir a investigação contra os filhos de Bolsonaro, o tigre desdentado rugiu de novo: “Veio inquérito especial para os meus dois filhos hoje. O mais velho e o zero dois sobre fake news. Mas não tem problema, não. Se jogarem fora das quatro linhas da Constituição, entramos num vale tudo no Brasil”. Há tempos a soldadesca belicosa do bolsonarismo mira o STF, contra quem o capitão ameaça esporear recorrentemente. Para domar o Parlamento usa um orçamento paralelo.
Para tentar intimidar o STF brande o chicote, em vão. Meia dúzia de milicianos aquartelados em Brasília chegaram a vomitar hinos integralistas em frente ao STF em 2020. Isso no mesmo dia da marcha de Bolsonaro e empresários rumo a Suprema Corte para salvar o generalato do CNPJ. Ali eram 9,8 mil mortos. Um exército de baixas patentes. “E dai?”, são meros CPFs cancelados. As ameaças de um ogro bolsonarista, um deputado desclassificado, foram o ápice. Ele acabar de voltar para cadeia por violar o uso da tornozeleira eletrônica.
A ministra Rosa Weber engrossou o caldo ao aceitar o pedido da Procuradoria-Geral da República para autorizar abertura de inquérito sobre a participação de Bolsonaro no processo de compra da vacina indiana Covaxin, pela qual ele escreveu uma carta ao primeiro-ministro da Índia em 8/1/2021. O depoimento dos irmãos Miranda à CPI reproduziu a pressão de autoridades do Ministério da Saúde pela vacina e o deputado Luís Miranda relatou que levou o caso da corrupção ao próprio Bolsonaro, que nada fez.
Adaptou versões e não desmentiu o deputado e, tampouco, esclareceu que tenha falado do envolvimento de seu líder, Ricardo Barros, na negociata. Mas a mamata acabou. Costuma entrar pelo cano quem acha que controla inquéritos policiais. A compra de vacina recende a ilegalidades e propinas.
A noite dos cristais já foi tentada por aqui. O tal grupo dos 300, que nunca passou de uma dezena de meliantes de meia pataca, atirou fogos sobre a sede da Suprema Corte em 2020. Nas manifestações que Bolsonaro prestigiou e convocou, faixas pediam o fechamento do Congresso e do Supremo. Bolsonaro vai recebendo, aos poucos, o troco das comichões golpistas.
Agora tenta encorpar seu exército de Brancaleone no STF indicando um vassalo acrítico e terrivelmente evangélico que fez investigações clandestinas sobre cidadãos, classificados de “antifascistas”, e levou um pito do STF. Sua trajetória até a capa preta do STF será mais acidentada que suas aventuras antidemocráticas no Ministério da Justiça e na AGU. Se passar no difícil teste do Senado, conflagrado pela CPI, se juntará aos liliputianos do STF, anões que criaram a aberração institucional, política, administrativa e humana chamada Jair Bolsonaro.