Há uma piada no mundo esportivo, geralmente atribuída a um treinador português. Diante do fato de que seu time estava em péssima situação no campeonato, prestes a ser rebaixado, ele resolve optar por uma tática arriscadíssima para tentar reverter a situação. Questionado sobre a adoção da tática, ele responde: “Estamos à beira do precipício. Resolvemos dar um passo à frente”.
A decisão do governo do presidente Michel Temer de retaliar nos partidos da base aqueles que votaram no Senado contra a reforma trabalhista parece conter um risco parecido com o assumido pelo treinador da piada. Se não deu o passo à frente, o governo no mínimo opta por um perigoso bailado à beira do precipício.
A decisão contrária no Senado à reforma trabalhista mostra o tamanho do rolo vivido no momento pelo presidente que sucedeu Dilma Rousseff. Acossado pela enxurrada de denúncias, depois da pancada que levou da Polícia Federal, órgão subordinado ao Ministério da Justiça, que diz ter encontrado evidências “com vigor” de que cometeu crime de corrupção passiva, Temer, pela demonstração do Senado, vê fortemente diminuídas as condições políticas de aprovar os pontos polêmicos da sua reforma. A decisão de retaliar os traidores é uma reação forte. Mas daquelas em que se pode dizer que a dose excessiva do remédio pode matar o paciente.
O alvo maior da ira de Temer são os traidores do PSDB. Mas os tucanos são justamente aqueles que, da sua habitual posição no muro, não sabem muito bem agora se ficam ou se saem do governo. Como reagirão a um processo forte de retaliação? Aceitarão o puxão de orelha ou reagirão a ele? Especialmente se no curso das investigações aparecerem novas evidências dessas que a Polícia Federal classificam como “com vigor”?
Mesmo fora do PSDB, possibilidades de retaliação podem gerar efeito contrário. O senador Hélio José (PMDB-DF) já começou a reclamar fortemente da decisão do governo de retirar cargos de indicados por ele. Temer precisará de votos. Não apenas para aprovar suas reformas. Se houver a abertura de um processo na Justiça contra ele, precisará de aprovação da Câmara. Além disso, há os pedidos de impeachment contra o presidente.
Neste momento, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) articula a formação de um grupo que vem sendo chamado de “nem-nem” (nem Dilma nem Temer). Tal grupo poderia vir a fazer, diz hoje o Painel da Folha de S. Paulo, um manifesto suprapartidário contra as reformas.
Fica o bailado de Temer à beira do precipício. Se nada fizer de mais forte, pode, pela frouxidão, ver sua base animar-se a votar contra. Se optar por uma reação cuja dose seja mais forte que o recomendável, pode ver sua base debandar da mesma forma. São as agruras de um governo pelo menos momentaneamente enfraquecido…