Após a derrota do legado social dos governos petistas para a aposta no combate à corrupção como exercício de poder, o lulismo corre o risco de sofrer revezes mais sérios.
O anúncio de um décimo terceiro para o Bolsa-Família tranquiliza os mais pobres quanto ao fim dos programas sociais e garante a roda da microeconomia gerando como alicerce para a retomada econômica com um anabolizante a mais. Assim, permite que aqueles possam sonhar com a punição a corruptos sem medo de perder o mínimo conquistado, semeando o terreno para se reconhecerem no “retorno dos impostos roubados”, conforme a narrativa que ajudou a embalar Jair Bolsonaro, e até reduzindo a ansiedade com o futuro, caso funcione como estímulo econômico. O que vai depender da intensidade e eficiência da plataforma de Paulo Guedes.
A nomeação de Osmar Terra como ministro da Cidadania, que cuidará do assunto numa pasta englobando Desenvolvimento Social, Cultura, Esporte e Secretaria de Política Antidrogas, foi uma derrota para os setores mais radicais do bolsonarismo e pode ampliar o governo para a centro-direita, reposicionando narrativas clássicas deste espectro: o trabalho é a melhor política social, sem descuidar dos que não conseguem acessá-lo ainda, e cultura e esporte afastam as pessoas do crime e das drogas. Coisa que tem enorme aderência na consciência do “povão”. porém, esta derrota das alas extremas da nova força política nacional fica guardada para depois, uma vez que o que a bancada evangélica propõe se encaixar na encomenda.
O emedebista converge ideologicamente com o presidente eleito e não foi uma indicação partidária, e sim mais um gol da governabilidade com bancadas temáticas.
Por outro lado, a reflexão de Bolsonaro sobre manter o Ministério de Direitos Humanos após sugestão da senadora tucana Mara Gabrilli, ativista do tema com enfoque nas pessoas com deficiência (caso dela), aponta para a resinificação do identitarismo petista, com chances de atrair não só batalhões de lideranças e ativistas LGBTs, mulheres, negros etc como acalentar corações de pessoas comuns que formam ou não tais grupos. Aliás, como a senadora mesmo alertou o presidente eleito.
Como escrevi no artigo Não se iluda com Bolsonaro, “Bolsonaro não vai entregar mulheres, negros, jovens, LGBTs etc para a oposição. Sob as nuances da segurança, igualdade de tratamento ‘como humanos’ e ‘irmãos’, e do respeito politicamente incorreto à diversidade, poderá construir seu próprio identitarismo” e “#EleNão (impossível perder a piada) precisa aprovar nenhuma das suas pautas culturais e mesmo sobre a segurança pública ou o Direito Penal. Basta que o Congresso as discuta. Se aprovar, ponto. Senão, ponto também. Pela tentativa. E o ônus vai para o sistema político. O capitão somente deve deixar claro ao seu fã-clube fiel (57,7 milhões de eleitores) que se esforça e se mantém firme nos compromissos”.
O lulismo pode ainda não saber, mas tem pressa. Muita pressa. Até porque Terra vai disputar os artistas, ele afirma que “existe uma tendência de empresas darem recursos a artistas de mais prestígio e que nem precisariam ser beneficiados porque só seus nomes já dariam grandes bilheterias, enquanto artistas iniciantes e de arte popular não tinham acesso”. “É isso que nós temos que ver. Vamos fazer uma auditoria, sem fulanizar nada vamos fazer uma auditoria e vamos ver de que forma até estabelecer de repente uma cota para que um artista não tenha milhões à sua disposição e o outro não tenha nada”, disse.