Se alguém tinha alguma dúvida que Jair Bolsonaro ingressou de vez no chamado establishment, agora não tem mais. O almoço amigável do final de semana, com direito a abraço hétero no ministro Dias Toffoli, foi um sinal mais que claro de que não se trata apenas de estratégia para garantir a governabilidade. Mas a cereja do bolo na formalização da aliança com a velha política foi a entrevista do senador Renan Calheiros à CNN na última terça-feira elogiando o presidente da República.
Bolsonaro se elegeu com o discurso de que representava a ruptura com o establishment. Aproveitou-se da ausência do seu nome nas enormes listas dos envolvidos no escândalo do Petrolão – não se sabe se por falta de oportunidade –, para se apresentar como o candidato da Lava Jato. Prometeu que o combate à corrupção seria uma das prioridades do seu governo. Não aguentou uma rachadinha.
Na entrevista à CNN, entre outras coisas, Calheiros – enrolado até o último fio do implante em investigações de corrupção -, exaltou o enfraquecimento da Lava Jato. “Ele [Bolsonaro] pode deixar um grande legado ao Brasil, que é o desmonte desse estado policialesco”, comemorou.
O senador alagoano listou todas as ações do presidente da República para enterrar de vez a Lava Jato e desmoralizar os principais expoentes da operação desde a retirada do antigo Coaf do Ministério da Justiça, passando pela demissão de Sérgio Moro, nomeação de Augusto Aras para procuradoria da República até a indicação de Kassio Marques para a vaga de Celso de Mello no Supremo.
Além da gratidão ao presidente, que vem destruindo a Lava Jato de forma sistemática – coisa que o PT e o MDB não conseguiram -, Renan tem visto a popularidade do presidente crescer vigorosamente no Nordeste, especialmente depois do auxílio emergencial. Se for aprovado um novo programa social nos moldes do “Bolsa Família”, incluindo mais gente e com valores mais altos, essa popularidade vai se solidificar.
Como político experiente, Renan sabe que não pode prescindir do apoio do governo federal em um estado pobre como Alagoas, governado por ninguém menos que Renan Filho. Tem consciência de que tem muitas coisas em jogo, inclusive a manutenção do seu poder político em Alagoas, já que o seu o mandato de senador só termina em fevereiro de 2027.
Para não se precipitar tem agido de forma discreta e pontual, porém decisiva. Renan é cauteloso e quer valorizar seu passe. Afinal, são poucos os políticos com a capacidade de mimetismo e articulação que ele tem. Tampouco quer perder de vez o apoio dos petistas, de quem foi aliado durante muito tempo, porque sabe que Lula ainda é um nome forte no Nordeste.
O fato é que a aproximação de políticos como Renan Calheiros mostra muito sobre a guinada de Bolsonaro em pouco mais de um ano e meio de mandato. O presidente descobriu o quanto é bom fazer parte do establishment, e certamente não vai trocar esse apoio que vai garantir não só que chegue ao final do seu mandato, mas que vai ajudá-lo a se reeleger.
Enquanto isso, antigos apoiadores como Sara Winter e Allan dos Santos choramingam nas redes sociais o desprezo do “mito”.