Nas redes sociais o capitão Jair Bolsonaro é zombado pelos adversários. É chamado de Bozo, um palhaço idiotizado, nascido nos EUA e macaqueado mundo afora. Além da sonoridade, o personagem bufão se harmoniza com o picadeiro governista, arena imprópria para pantomimas e jocosidades macabras. Depois de 17 meses de ilusionismo mambembe, desprezo ao respeitável público – aos mais de 53 mil mortos e suas famílias – e muitos esqueletos apodrecendo nos camarins, o cerco contra o circo se fecha.
No apogeu, quando as caravanas coloriam as cidades, a meninada exultava: “o circo chegou”. Nas inesquecíveis matinês dominicais, o palhaço intimava: “Criançada, hoje tem marmelada? O público retribuía: “Tem sim senhor”. Abria-se um universo místico de fantasia e magia. Bons tempos. Esse circo definhou, outro chegou. No apagar das luzes, muito nos foi subtraído, sobretudo vidas. As atrações do momento transformaram a marmelada em trapaça, a magia em fraude e o entretenimento em tormenta golpista, agora domesticada.
O STF chicoteia impiedosamente um tigre desdentado, acuado. Reagindo às fanfarronices golpistas, em pelo menos 4 devaneios autoritários públicos, o STF enjaulou o capitão e parte do coro extremista. Protegeu os estados no combate a pandemia, barrou um saltimbanco na PF, preservou a lei de acesso à informação, derrubou a blindagem penal preventiva, vetou a charanga “Brasil não pode parar”, manteve a CPMI das Fake News e, na matinê – horário nobre – exibiu o show de horrores da burlesca reunião ministerial de 22 de abril.
A Suprema Corte açoita ainda com 3 investigações que, em tese, podem atingir ao líder da fanfarra pela prática de crimes comuns. São camas de pregos pontiagudos sobre intervenção na PF, disseminação e patrocínio das Fake News e as marchinhas golpistas. Elas já redundaram na busca e apreensão e quebras de sigilo de dezenas de micos amestrados. Entre 11 parlamentares com sigilos quebrados está madame Zambelli, cartomante. Uma bruxa com poderes premonitórios sobre operações policiais contra inimigos.
Outros quatro parlamentares, apontam as investigações da PGR, atuavam como pipoqueiros. Alimentavam a plateia ao mesmo tempo que amealhavam fundos para os números golpistas. Recolhiam as moedas nos guichês públicos, da cota parlamentar da da Câmara dos Deputados, trocadas para remunerar as bandinhas desafinadas usadas para animar a ruptura institucional, na internet ou nas ruas. O capitão animou muitos desfiles, sem proteção, em plena pandemia. O carequinha, Eduardo Bolsonaro, trombeteou que a ruptura não era “se”, mas “quando”.
No TSE os tambores também rufam. Foram abertos os julgamentos dos processos envolvendo acrobacias, fraudes, notícias falsas e manipulação de operações policiais com eventuais impactos eleitoral em 2018. A corda ficou bamba e sem sombrinha. O empresário Paulo Marinho, ex-integrante da trupe, afirmou que um delegado procurou Flávio Bolsonaro para informar sobre as investigações contra Fabrício Queiroz. Disse que a Operação Furna da Onça, que mirava Queiroz, foi adiada para depois do 2 turno a fim de ajudar o histrião.
Fabrício Queiroz é o mágico, com cartola e capa. Recorria a truques para desaparecer. Está em Bangu. Foi homiziado durante 1 ano em um camarote do então advogado de Flávio e Jair Bolsonaro, Frederico Wassef, em Atibaia. O fim da invisibilidade do Queiroz levanta muitas lebres. Reacendeu centelhas e engulhou as fardas que urravam “selva”. Queiroz é o homem bala. O último arquivo, Adriano de Nóbrega, foi baleado. Salvo um pacto de silêncio, as labaredas e a fumaça intoxicam a companhia, cuja gerência oferece filé mignon para a família, ração regulada para poucos e bananinha para os demais. A procrastinação no tribunal carioca não apaga as provas.
O rábula da caravana, Frederico Wassef, sinalizou que topa incorporar o mímico na representação. Mas é um silêncio falastrão, estridente. O contorcionista isentou a dupla – Flávio e o pai – sobre o acoitamento do miliciano. O próprio capitão tentou justificar em seu número que Queiroz estava em Atibaia pela proximidade – 90 km – do local do tratamento médico. Wassef também deu outra cambalhota kafkiana: “Quem que disse que ele tava morando na minha casa? A féria da empresa da ex-esposa, Cristina Boner, adubada na administração Bolsonaro espalhou um odor indisfarçável.
O Ministério Público do Rio fareja como senador Flávio Bolsonaro administrava a bilheteria no início da carreira, como deputado estadual. Por lá malabaristas da milícia carioca e seus parentes recebiam salários e devolviam parte ao manipulador de marionetes, intermediado por Queiroz, o capataz. O processo de cassação contra o senador ganha ares de globo da morte com fachos de luz multicoloridos e ofuscantes: obstrução da justiça, coação e adulterações de provas.
Em novembro de 2015, Delcídio do Amaral foi o 1 senador preso no mandato. Passou 87 dias na jaula por embaçar a investigação. Parlamentares só podem ser presos em flagrante por crimes inafiançáveis. O delito foi indiscutível, mas Delcídio não foi pilhado em flagrante. O STF usou o “flagrante continuado” para embasar a cana. Queiroz, encantador de serpentes, outra atividade de risco, foi acobertado pelo advogado da família. Se aparecer a varinha do 01 na prestidigitação, o precedente existe. Ele foi referendado por 59 votos a 13 no plenário do Senado.
Abraham Weintraub não está apto a números maiores, por isso é o pestilento domador de pulgas, invisíveis como seu legado no MEC. Foi enxotado para iniciar o armistício com as capas do STF, xingados de “vagabundos”. No anonimato da coxia ministerial, ele zurrava. Depois o paquiderme fugiu como um rato. Refugiou-se nos EUA, onde atua o astrólogo-adestrador. Camuflou-se no cargo para burlar as restrições sanitárias dos EUA. A fraude – um buraco na lona – foi remendada, antecipando a demissão em 1 dia. A deportação ainda é uma ameaça.
A oposição, mesmo dividida em razão de projetos políticos concorrentes, afia a mira na função de atiradores de facas. Diante de uma gravidade única, mais de 40 pedidos de impeachment, por crimes de responsabilidade de toda ordem e reincidentes, entulham a arena de Rodrigo Maia. O parlamento se porta, até aqui, como burocrata da democracia, calculando prazos, votos e flagrando quedas e tombos. Observa o circo pegar fogo. Haverá a hora de entrar em cena.
A atração principal é um anão institucional, protagonista tosco e mal ensaiado de espetáculos antidemocráticos e mentiras de perna curta. Anda esquálido como faquir, engolindo fogo. Abandonou atos absolutistas, evita as focas adestradas do Alvorada, engavetou o folguedo das bravatas depois de constatar a falta da rede de proteção sob o trapézio. Espectadores e palmas rareiam na arquibancada. Os mais curiosos têm credenciais do centrão: equilibristas do malfeito e inconfiáveis. Dilma Roussef e Collor de Mello, atirados aos leões, conhecem a índole das feras. Pela gravidade do cerco o capitão não ruge mais.
As farândulas do capitão e do último milico, João Batista Figueiredo, têm convergências além da farda. São irascíveis, despreparadas, exibem uma coloquialidade vulgar, a imprensa é inimiga, a economia está em frangalhos e o brasileiro, na lona, sem pão, só o circo rudimentar. Ambos também tiveram banqueiros como amansadores da economia. Mário Henrique Simonsen, ministro de Figueiredo, foi mordaz sobre os riscos da atividade circense: “O trapezista morre quando pensa que voa”.