Não dá para passar batido diante da visita de Nicolas Maduro ao Brasil. Muito se tem dito sobre a importância de retomar as relações, principalmente as econômicas, com a Venezuela. É um país vizinho, com quem dividimos longa fronteira e, por consequência, temos muitas questões em comum a resolver.
Não estou sendo original ao afirmar que devemos manter relações diplomáticas independentemente do regime e da orientação ideológica de cada país, afinal temos negócios a fazer com o mundo todo. Nenhum comerciante que quer vender seus produtos pede atestado de idoneidade ao comprador, desde que ele demonstre condições de arcar com a despesa.
Dito isto, e continuando absolutamente sem originalidade, questiono o excesso de deferência pública de Lula a Maduro. Que eles tenham uma relação além da protocolar que seja celebrada em momentos de intimidade.
Em seu discurso que precedeu a entrevista coletiva, Lula afirmou que Maduro foi eleito em um pleito livre e democrático e que a Venezuela tem imprensa livre. Maduro, em seu breve discurso, enalteceu a importância de ser tolerante com quem pensa diferente, apesar de seu governo claramente não permitir que a oposição avance.
Maduro é um ditador. A Venezuela não vive uma democracia. A imprensa, o judiciário e o legislativo são controlados pelo poder central. Os direitos humanos não são respeitados naquele país. Criticar os embargos que os nossos vizinho sofrem é legítimo, uma vez que sacrificam o povo muito mais do que o governo, mas não dá para dourar a pílula.
Lula foi eleito por uma frente ampla que englobou uma grande parcela de eleitores mais ao centro, que certamente são críticos do atual governo venezuelano, e sem os quais não sairia vencedor. Além disso, muitas pessoas, talvez a maioria, que se alinham ideologicamente com a esquerda não defendem o regime imposto por Maduro à Venezuela. Afinal, quem gosta de defender a ditadura e maltratar a imprensa é Bolsonaro e seus discípulos.
Ao enaltecer Nicolas Maduro, Lula corre o risco de diminuir sua própria história e a do PT.
Seus opositores e a famigerada extrema direita gostam de dizer que Lula quer fazer do Brasil uma ditadura, apesar de nunca termos chegado perto disso durante os governos petistas.
Lula sofreu críticas e processos durante o mensalão e a operação Lava Jato, chegando a ser preso e a perder seus direitos políticos. Dilma sofreu impeachment. Um opositor se elegeu e governou por quatro anos. Lula voltou através de eleições livres e democráticas. Em todo esse período, a imprensa fez seu trabalho livremente e os poderes legislativo e judiciário funcionaram com independência.
Tomara que Maduro aprenda alguma coisa com Lula, principalmente a ser democrático de verdade. E que Lula pare de passar pano para ele.