Às vésperas da chegada de Lula em Portugal, suas recentes declarações sobre a guerra e sua presença no Parlamento, dia 25 de abril, dividem a classe política e geram críticas entre os partidos portugueses.
Mesmo se o PS tentar minimizar as posições de Lula sobre a guerra, cada vez mais ambíguas e contraditórias, e lembrar que o presidente brasileiro tenta buscar a paz, o que se vê é uma saraivada de condenações.
O PSD, do presidente português Marcelo Rebelo de Sousa, pressiona o governo para que se desmarque de Lula. O vice-líder do partido, Paulo Rangel, deixou claro que Lisboa “não pode deixar de se desmarcar, pelas vias diplomáticas adequadas mas também publicamente, da afirmação de que a União Europeia, a OTAN e os Estados Unidos fomentam e estimulam a guerra”.
“Com a mesma franqueza e até desassombro com que o Presidente do Brasil fala da cumplicidade e intervenção da União Europeia e procura suavizar ou omitir a responsabilidade do regime de Putin, o primeiro-ministro António Costa deverá afirmar a posição de Portugal a favor do direito internacional, da integridade territorial da soberania ucraniana e da paz”.
Em bom português, Lula vai passar por uma saia justa. Mesmo se Celso Amorim veio socorrer o presidente brasileiro, declarando que o Brasil não precisa se aliar sistematicamente aos Estados Unidos, não é possível afirmar que os dois beligerantes são responsáveis, pois iniciaram a guerra, mas que um invadiu e o outro foi invadido. E que portanto o país invasor tem que deixar os territórios do país invadido. Muito embora isso também faça parte de negociações de paz.
A posição de Portugal, inclusive da esquerda, é infinitamente mais clara. Jamila Madeira, líder do PS no Parlamento, confirmou que Portugal, o governo, o PS têm a mesma posição desde o primeiro minuto, em solidariedade com a Ucrânia e com a “defesa do direito internacional e condenação do Estado que invadiu”, a Rússia.
Esta posição será lembrada a cada vez que Lula criticar a postura dos ocidentais, sobretudo da Europa. Acredita-se, porém, que ele não será tão assertivo, já que seu discurso recente foi moldado para satisfazer a China, a Rússia dos BRICs e a ala mais radical do PT.
Mesmo assim, Lisboa tenta justificar a presença de Lula nas comemorações do 25 de abril. Primeiramente, lembrando que a Revolução que pôs fim ao salazarismo foi um movimento de esquerda; segundo, que o presidente brasileiro está numa cruzada contra a guerra.
Para Jamila Madeira, “sem prejuízo de condenar veementemente o momento de violação do direito internacional de provocação desta guerra pela Rússia”, é necessário “tentar procurar o mais possível que, no quadro mundial, se retome a premissa da paz”.
A verdade porém é que a esquerda parece isolada, tantas são as vozes que condenam as reviravoltas de Lula. Não apenas em Portugal, mas toda a Europa.
A direita portuguesa se manifesta abertamente contra a presença do brasileiro; considera que o Parlamento, que convidou Zelensky para discursar há um ano não pode receber um aliado de Putin como Lula no 25 de Abril. E o presidente da República, que atribuiu a Ordem da Liberdade a Zelensky, não pode admitir a presença de um aliado de Putin como Lula no 25 de Abril”.
O presidente do partido Chega, André Ventura, radical de direita, defendeu que Lula deve ser condenado pela “proximidade com a Rússia”, pela “incapacidade de ver o sofrimento do povo ucraniano”, pela “sua proximidade à China”, pela “hesitação em condenar as ditaduras sul-americanas” e pela “corrupção”, apesar das decisões que condenaram o presidente brasileiro nesse âmbito terem sido anuladas devido a erros e irregularidades processuais.
Para a direita, Lula será sempre corrupto e, por isso, indigno de pisar o chão da Assembleia da República, sobretudo no dia em que se comemora a Revolução.
O Chega promete organizar a “maior manifestação contra um dignitário estrangeiro em Portugal”.
Por outro lado contudo, lembra Carmo Afonso, articulista do Público, de Lisboa, “Lula da Silva representa a luta contra a ditadura, a luta dos trabalhadores e, agora, a derrota da direita populista e a correspondente vitória da esquerda. É dessa matéria que é feito o 25 de Abril — um golpe militar, que foi uma revolução, que foi uma festa. Seria bom que, pelo menos os que amam a revolução, acolhessem esta visita.”
Lula será recebido e discursará na Assembleia da República numa sessão de boas vindas no dia 25 de Abril, marcada para as 10 da manhã. Uma hora e meia depois haverá a tradicional sessão solene, que marca o aniversário da Revolução dos Cravos.