Há muito não conversava com um amigo meu, o piauiense, quase universal, Zé Bronquinha. Batizado de José das Chagas de Jesus da Silva, havia sumido de Brasília desde o impeachment da Dilma em 2016. Nordestino forjado na luta pela sobrevivência, o Zé cresceu em Brasília cultivando o sonho de ser um revolucionário.
Quis o destino que sempre chegasse atrasado na história que queria ter vivido. Foi assim desde a descida da Sierra Maestra, passando pelo golpe de 64, a luta pelas diretas e por aí afora. Ardoroso defensor dos governos petistas, brigava nos bares e em outras praças para defender o projeto Lula/Dilma. Usava a mesma veemência que lhe fizera ganhar o apelido de Bronquinha desde as peladas de rua na infância.
Soube que tinha voltado para o Piauí. Suportou o afastamento da presidente, até a posse de Temer, mas não engoliu a eleição do capitão de jeito nenhum. Preferiu uma espécie de exílio sabático na terra natal. Foi lá que o encontrei. Liguei para trocar informações pessoais sobre a pandemia, como estava suportando o tédio do confinamento, a distância dos bares, a falta de abraços afetuosos e dos beijos (poucos) das moças. Respondeu que estava superando bem o período e se readaptando ao Nordeste. Foi quando indaguei se era verdade que o capitão teria substituído Lula no querer dos conterrâneos dele. Depois de um longo suspiro começou uma pequena digressão:
— Tudo anda muito estranho no Brasil. As pessoas acreditam e reproduzem as maluquices do capitão. Compartilham nas redes sociais com fúria. Passam a mão na cabeça de notórios corruptos; batem palma para doido dançar; contrariam a ciência; aceitam a prescrição de remédios feita por um quase analfabeto; assistem inertes a destruição de marcos civilizatórios; ficam de cócoras para o maluco do Trump; negam a pandemia; atacam a democracia e você vem me perguntar o porquê da troca? Ora, meu caro, nordestino não gosta desse ou daquele político, gosta é de governo.
Voltamos a falar amenidades e nos despedimos. Acho que o Zé Bronquinha foi cruel com nossos conterrâneos. Não é apenas o nordestino que gosta do governo. Os fanáticos, corruptos e milicianos também. Além de generais pequenos, alguns gordinhos, que não perdem uma boquinha por nada. Tá difícil achar graça.