Cara de pau é a expressão idiomática do momento. Pouco antes de ser sabatinado para uma vaga no Supremo, o ex-ministro Paulo Brossard disse a este repórter que deixava a vida política porque não saberia suportar uma campanha de difamação nos moldes a que o modelo o “denuncismo” estava levando o País.
O velho tribuno dizia que aquela fórmula (dossier+repórter investigativo+politico na tribuna+linchamento midiático) se tornaria uma ameaça insuportável. Qualquer homem público estaria exposto à execração sem defesa consequente, pois o próprio esvaziamento de denúncias fabricadas inviabilizava a defesa e a retratação. Uma fórmula maldita, dizia o parlamentar, justificando-se porque saia dos plenários e dos palanques para uma participação protegida no STF de então.
Ele dizia que nenhum homem de vergonha poderia se submeter a tais perigos, pois, vaticinava, dali se chegaria ao apedrejamento nas ruas. Sua formação impedia-lhe de sofrer tais humilhações sem reagir à altura, o que seria pior do que tudo. Melhor sair de cena. E concluía: “somente isto que vocês (jovens) chamam de “cara de pau” para se submeter calado às ofensas de velhas histéricas no meio da rua”.
Pois Brossard não imaginava que essa cena chegaria e, mais ainda, pegaria um ministro do Supremo e, pior ainda, no Exterior. Filmada e gravada, viralizada nas mídias sociais, reproduzida na imprensa sem que qualquer chefe de reportagem mandasse um repórter averiguar se haveria alguma coisa por trás daquela cena tão bem produzida, as turistas de Lisboa cumprem o vaticínio do jurista gaúcho.
Aí vêm as eleições e os “caras-de-pau” sem medo de entrar em aviões ou circular nas ruas debaixo de xingamentos a se proporem candidatos a mandatos. É preciso mais que coragem, cara dura. Quem for trigo limpo não pode ter medo de se jogar no saco de joio. Ou então, como fez Brossard, prudentemente sair de cena antes de pisar numa mina explosiva.
Isto significa que o segmento político do País está condenado à imobilidade, se não houver uma reação. De quem? Talvez dos eleitores, como se apregoa, nas eleições de outubro. Ou mudar de geração e de paradigma.
A História do Brasil demonstra que o crescimento econômico e o desenvolvimento social e político se dão aos trancos, com gerações de notáveis, seguidas por outras de mediocridades.
Um exemplo, embora não seja reconhecido, a geração dos abolicionistas enfrentou o atraso e a reação, mudando o País com a reorganização do trabalho e desembocando na República que, bem ou mal avaliada, fez grandes reformas.
A célebre geração de 1930, com seus nomes emblemáticos e reformas tão profundas que a maior parte delas até hoje estão em vigor, como a CLT, o estado empresário e tantas outras “conquistas”, como o estatuto próprio para o funcionalismo que Michel Temer quer derrubar como básico para a reforma da previdência.
A geração de 1970, que sai de cena emblematicamente no desaparecimento do helicóptero de Ulisses Guimarães, combatendo a ditadura militar. Essa turma com seu MDB retirou da vida política os últimos resquícios do varguismo, cujo viés autoritário castilhista sobreviveu até meados dos 1980 sob o tacão do autoritarismo militar, que também sucumbiu com o desaparecimento físico de seus mentores, como Castello, Geisel, Cordeiro de Farias, Felinto Muller e tantos outros nomes célebres dos estertores do tenentismo.
A geração dos 1970 rompeu com o pior legado do autoritarismo varguista, que era a inflação endêmica, a que um desenvolvimentismo curioso atribuía virtudes sócio econômicas. Itamar Franco e Fernando Henrique, os jovens daquela turma dos democratas e completaram a obra e a entregaram o poder ao sindicalismo industrialista e à intelectualidade acadêmica.
Esta geração, entretanto, ainda não disse a que veio e corre o risco de entregar o País a seus sucessores mergulhado num apagão fiscal como nunca o Brasil viu, nem mesmo nos tempos de Dom Pedro I quando se criou do nada um estado que logo se revelou inadimplente. Até o Banco do Brasil quebrou. Aqui não se fala de esquerda nem de direita, mas de uma geração inteira que se enrola em debates surrealistas e não resolve nada.
Os municípios, os estados e logo em seguida a União vão, um a um, caindo na fogueira, enquanto isto. Na insanidade, levarão por água abaixo ao fundo do poço a economia vigorosa que parece indiferente a tudo isto e continua bombando. O setor privado também será abatido pela ausência de estadistas?
A perplexidade e o fim melancólico deste modelo em vigor estão aí a sucumbir às sovas de sombrinha de velhas senhoras indignadas. Entretanto, abram-se os olhos, pois em política não existem espaços vazios. Que nos reservam as urnas de outubro? Como muito bem indaga nosso colega Andrei Meireles, a conferir