Breve análise das eleições

Passada a eleição, é hora do futuro presidente começar a fazer suas alianças para garantir o cumprimento das promessas de campanha. Se não cumprir, o bolsonarismo voltará recarregado, preparando-se para 2024 e 2026.

A escolha está feita. O segundo turno refletiu o desenvolvimento da campanha, como resultado inevitável dos últimos quatro anos. Pelo caminho ficaram políticos vencidos.

Presidente eleito, Jair Bolsonaro.

Jair Bolsonaro foi eleito por acaso em 2018. Deputado do baixo claro e candidato indicado por partido inexpressivo, mostrou-se incapaz de entender a direção do vento. Cansada do Partido dos Trabalhadores, a população havia acompanhado o julgamento de Luís Inácio Lula da Silva, envolvido pelo Mensalão e na Operação Lava Jato, com dezenas de companheiros de legenda e de empresários, acusados de desvios de dinheiro público.

Para a vitória de Bolsonaro foi fundamental a punhalada sofrida em Juiz de Fora. A tentativa de assassinato de candidato à Presidência da República, no aceso da disputa, provocou irresistível movimento de solidariedade ao capitão hospitalizado em estado grave, incapacitado de dar entrevistas, fazer discursos, participar de debates pelo rádio e televisão.

É impossível negar que a vitória foi recebida com entusiasmo pelo povo exausto de corrupção. Ignorava-se, entretanto, o que pensava do Brasil o novo presidente. Acreditou-se que seria sopro renovador dos péssimos costumes da política, aprofundados nos dois mandatos de Lula e um mandato e meio de Dilma Roussef, deposta por pedaladas fiscais.

Hospital usa ventilação não invasiva na recuperação de pacientes com Covid-19 – Foto Governo do Piauí

A inesperada pandemia do Covid-19 contribuiu, porém, de maneira decisiva para radical mudança do quadro político. As repercussões sociais, econômicas e no mercado de trabalho, atingido em cheio pelo desemprego, exigiam providências rápidas e certeiras. O vírus – que se supõe importado da China – era, e ainda é, desafio para a ciência médica. Nos primeiros meses o Ministério da Saúde se esforçava para entender o que acontecia, e orientar a população no sentido de se preservar da melhor forma possível. Bolsonaro adotou postura negacionista. Contestou a medicina e os melhores infectologistas. Errou e lhe debitaram a responsabilidade por mais de 650 mil mortos.

Foi sob o clima de terror que o presidente da República indicou o caminho aos opositores. Aquele que era uma esperança, se transformou em ameaça e perdeu aliados. Entrou em processo de isolamento cercado pelos filhos, bajuladores, ministros avessos à política e generais da reserva, colocados em cargos de primeiro escalão.

Getúlio Vargas

Não é o caso de se radiografar o período 2018-2022. As eleições trazem resultados concretos e definitivos. Na esfera indecifrável da política Lula ressurgiu dos mortos. Coisa que só acontece na América Latina. Lembrem-se de Getúlio Vargas e de Juan Domingo Perón, o demagogo argentino (1895-1974), casado com Eva Perón e Maria Isabelita.

A política é terreno avesso a soluções exóticas. A economia não comporta atalhos. Os próximos anos serão desafiadores. O Brasil está em crise. Embora em queda, o desemprego permanece elevado. Lula não contará com maioria estável e confiável na Câmara e no Senado. Alianças cosidas pela cobiça custam caro e são voláteis. Segundo os usos e costumes, a oposição será implacável. Jair Bolsonaro foi derrotado deixando, como legado político, o bolsonarismo mais robusto do que qualquer partido.

Auxílio Brasil – Foto Divulgação

O pêndulo de Arnold Toynbee oscila. Após alcançar a extrema esquerda, iniciará o caminho de volta à direita verde e amarela. A vitória de Lula foi assegurada pelo Norte-Nordeste. Isto resulta na necessidade de enormes investimentos, para acabar com a pobreza e o subdesenvolvimento onde são mais graves. Não bastará o auxílio-emergencial. Retirar 33 milhões de condições desumanas, cobra medidas rápidas e impactantes.

As massas nas ruas, praças e avenidas, e o bloqueio de rodovias por caminhoneiros revoltados, indicam o alto grau de insatisfação provocado pela vitória da esquerda. As posições se invertem. O PT e os partidos de extrema esquerda aliados, experimentarão o gosto amargo e a força da oposição, liderada por inconformado Jair Bolsonaro.

Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – Foto Orlando Brito

Como no matrimônio, em política a lua de mel é passageira. Seguir-se-ão cobranças e necessidades. O PT e Lula não possuem consistência ideológica. As bases de que dispõem são frágeis e fisiológicas. O presidente dependerá de inevitável aliança com o Centrão. Se retardar o cumprimento das promessas, o bolsonarismo voltará recarregado, preparando-se para 2024 e 2026. Quem viver, verá.

– Almir Pazzianotto Pinto é advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

 

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