O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, é aguardado por setores da Câmara interessados, como ele, na aprovação do projeto que estabelece a autonomia técnica e administrativa da instituição. O relator do projeto, Celso Maldaner (MDB-SC), acredita que o entendimento entre Campos Neto e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com a participação dos líderes partidários, pode facilitar a colocação do projeto em pauta.
Na prática, o Banco Central vem tendo autonomia para atingir os seus objetivos desde o final da década de 1990, mas a formalização deste modelo representaria um avanço institucional considerável. Atual presidente do BC, o economista Roberto Campos Neto, falando à Revista Veja (edição de 16 de outubro), disse que “haverá um ganho de credibilidade quando isto acontecer”.
Campos Neto é defensor da autonomia, assim como o foram Armínio Fraga, presidente do Banco Central na segunda metade do governo Fernando Henrique Cardoso, Henrique Meirelles, no Governo Lula, e Ilan Goldfajn, no Governo Temer.
São exemplos de bancos centrais autônomos o Banco Reserva da Nova Zelândia, o pioneiro na adoção de metas de inflação em 1989, o FED americano, o Banco da Inglaterra e o Banco Central Europeu. Na América do Sul, o Banco Central do Chile é autônomo e voltado para o cumprimento das metas de inflação.
Governo propõe autonomia
O governo enviou este ano ao Congresso um projeto propondo a autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira do Banco Central e definindo seus objetivos: a estabilidade de preços, considerada fundamental, e, sem prejuízo do primeiro, a estabilidade financeira.
A rigor, a autonomia estaria relacionada à definição sobre como atuar para atingir as metas e objetivos estabelecidos. As metas de inflação são definidas pelo Conselho Monetário Nacional, órgão superior do sistema financeiro, presidido pelo ministro da Economia.
O PLP 112/19 transforma o Banco Central em autarquia de natureza especial, sem vinculação a ministério (hoje é vinculado ao Ministério da Economia), sem tutela ou subordinação hierárquica. Os mecanismos de prestação de contas são preservados, bem como o controle externo, exercido pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e por auditoria independente.
O projeto prevê mandatos de quatro anos para os diretores colegiados não coincidentes com o do presidente da República, com a possibilidade de uma recondução, e define as hipóteses de designação e exoneração.
O presidente e diretores continuariam sendo indicados pelo presidente da República e nomeados por ele após a indicação ser aprovada pelo Senado.
Entre outros motivos, os dirigentes podem ser demitidos por desempenho insuficiente, mas, para tanto, o ato de exoneração precisa ser submetido ao presidente da República e aprovado pela maioria absoluta do Senado.
O presidente do Banco Central, que atualmente tem status de ministro de Estado, passaria a ter, assim como os diretores, cargo de natureza especial.
O projeto tramita na Câmara com urgência regimental, podendo ser votado diretamente no plenário, dispensando-se a manifestação da Comissão de Constituição e Justiça, para a qual foi despachado.
Não se nota na Casa qualquer expectativa em relação a esse tema. Projetos como o da posse e comercialização de armas, assim como o pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, são preocupações mais facilmente percebidas.
O deputado Celso Maldaner, designado relator na Comissão de Constituição e Justiça, ainda não apresentou parecer, o que pretende fazer somente em plenário.
A leitura da situação pela ótica de setores da economia é otimista com relação à aprovação da proposta, mas é preciso considerar que o Congresso é uma instituição eminentemente política. Deste ponto de vista, a aguardada reunião com os líderes de bancada pode representar o primeiro parâmetro para avaliação das reais chances de aprovação da autonomia do Banco Central.
Projeto de Itamar Franco
Apesar da relevância, o projeto do governo não encabeça a fila de matérias que tratam da organização do Banco Central e de sua autonomia. Seguindo a técnica legislativa, esse papel cabe ao projeto mais antigo em tramitação: o PLP 200/89, de autoria do então senador Itamar Franco, do PRN, partido pelo qual se elegeu vice-presidente da República na chapa formada com o atual senador Fernando Collor.
O projeto de Itamar Franco, aprovado na época pelo Senado, foi apresentado na Câmara em novembro de 1989. Inicialmente, ele não tratava de autonomia da autoridade monetária, mas de requisitos para o exercício dos cargos de diretoria e de presidente do Banco Central.
Bem ao estilo do autor, o projeto impunha rigor nos requisitos.
Determinava que a escolha dos dirigentes deveria recair, preferencialmente, sobre servidor do BC. Vedava a designação de pessoa que, nos últimos quatro anos, tivesse exercido atividade profissional em empresa integrada do sistema financeiro. Neste caso, Armínio Fraga, Henrique Meirelles, Ilan Goldfajn e Roberto Campos Neto não poderiam ser presidentes do banco.
Somente Alexandre Tombini escaparia. Presidente do Banco Central no Governo Dilma Rousseff, ele ingressou na instituição por concurso.
Após o exercício no cargo, o ex-titular amargaria uma quarentena de dois anos antes de poder exercer atividade em empresa do sistema financeiro.
Dez anos depois de chegar à Câmara, em 1999, o parecer aprovado na Comissão de Finanças e Tributação já estabelecia mandato de três anos para o presidente e diretores do BC, sendo permitida a recondução.
Quando recebeu parecer na Comissão de Constituição e Justiça, em 2009 (o relator foi o então deputado Eduardo Cunha), o projeto puxava uma fila de 18 matérias tratando de tudo o que diz respeito ao Banco Central, inclusive um projeto do deputado Rodrigo Maia, atual presidente da Câmara, sobre autonomia. Hoje a fila tem 24 matérias.