O saçariquento presidente norte-americano continua a quebrar tabus, dogmas e convenções. Enquanto os políticos profissionais deixam de honrar suas promessas eleitorais, o marido de Melania mantém sua palavra. No mundo em que os políticos não cumprem o que prometem nos palanques, aqui está um cara que pratica o que ele prega.
A lista é longa e vem crescendo. Trump retirou os Estados Unidos do acordo comercial Parceria Transpacífico (TPP, na sigla em inglês), do Acordo de Paris contra as mudanças climáticas, por considerar que este seja “desvantajoso” para os trabalhadores e os contribuintes; do acordo nuclear com o Irã, ignorando os apelos dos aliados europeus para que o pacto fosse mantido. O presidente mudou a embaixada dos EUA em Israel para Jerusalém.
Ele cortou as taxas de impostos das empresas americanas e vem preenchendo os postos chaves do judiciário com advogados conservadores e qualificados. Trump proibiu cidadãos de sete países de entrar nos Estados Unidos – a Suprema Corte confirmou a decisão na semana passada. Em 16 de julho, o presidente vai se reunir com Vladimir Putin em Helsinque. Analistas políticos enfatizam que esse “rendez-vous” tem como objetivo principal amortecer os conflitos entre os dois países, acentuados pela investigação em pleno vapor em Washington e também pela reação americana às agressões de Moscou à Ucrânia e outros países.
Alguém pode se opor a Trump sobre essas questões e muito mais, e ainda assim reconhecer que suas posições foram anunciadas na campanha eleitoral em 2016. Mas o ódio contra o presidente é tão profundo em alguns círculos que muitas pessoas não conseguem enxergar direito.
Até mesmo o projeto diplomático de Trump em relação a Kim Jong Un foi divulgado na campanha presidencial. Em maio de 2016, ele sugeriu que, como presidente, gostaria de negociar pessoalmente com o ditador norte-coreano. A resposta, da esquerda e da direita, foi hostil. “Frouxo, fraco, ingênuo, delirante” – todas essas farpas foram lançadas contra o novato na política externa.
E, no entanto, apesar do “clima pesado” do ano passado, Trump realizou uma proeza de alto nível com o líder do reino eremita. Embora o júri ainda esteja fora, Pyongyang libertou reféns americanos, suspendeu os testes nucleares e de mísseis e sinalizou a disposição de pelo menos falar em desnuclearização. Está muito longe das provocações do “Little Rocket Man” há um ano.
A base de Trump está preparada para ignorar suas inúmeras “falhas” de caráter. Em um nível, isso é difícil de engolir, porque o bufão desrespeitoso e desumano desvirtuou o discurso público outra vez.
No entanto, em uma cultura e sociedade polarizadas os seguidores de Trump são rotulados de “deploráveis”, milhões de contribuintes preferem optar para o diabo que conhecem. E os inimigos de Trump continuam a cair em suas armadilhas. O presidente manipula os membros dos partidos republicano e democrata. O marido de Melania mudou o cenário político nos Estados Unidos, e vem recrutando seguidores no mundo inteiro.
Oposição unida contra Trump
Semanas atrás, uma proprietária de restaurante no estado da Virgínia se recusou a servir à secretária de imprensa de Trump, porque ela não gostava de sua política. Ativistas perseguiram a secretária do Departamento de Segurança Interna dos EUA em sua casa, gritando “sem justiça, sem dormir”.
Enquanto isso, os Estados Unidos estão com um humor em alta. Tudo o que deveria estar em alta – crescimento, confiança – está em alta. Tudo o que deveria estar em baixa – taxa de desemprego, inflação – está descendo ladeira a baixo.
Para o desespero dos democratas, o resultado é que a agenda de impostos e desregulamentação de Trump parece estar funcionando, supondo que suas tarifas de importação – outra promessa eleitoral para os desempregados pela globalização – não atrapalhem o boom da economia americana.
Sobre a política externa, devemos frisar que, durante grande parte de 2017, o estabelecimento havia declarado guerra a Trump. A única vez que ele recebeu aplausos da mídia foi quando ele reforçou a linha vermelha de seu antecessor bombardeando a Síria. Nos dias de hoje, o presidente americano está livre e fazendo praticamente tudo o que ele quer. Ele se assemelha a uma força da natureza: “”Furacão Trump”.
Regra do jogo mudou em relação ao Brasil
Os Estados Unidos mudaram a política externa em relação ao Brasil, a ex-secretária de Estado Hillary Clinton e o ex-presidente Barack Obama jogaram milhões de dólares nas campanhas de José Serra e Aécio Neves. Nos dias atuais, Washington tem os olhos no “postulante populista” Jair Bolsonaro. “Brazilianists” acreditam que Bolsonaro derrotará qualquer candidato no segundo turno.
Quando o embaixador John Bolton se tornou conselheiro de segurança nacional em abril, a sabedoria convencional dizia que Trump adotaria um papel mundial duro, implacável e assertivo, exibindo os músculos do Tio Sam. De qualquer forma, o secretário de Defesa James Mattis estava lá, ajudando a manter o mito da “ordem internacional baseada em regras”.
Na maior parte do tempo, Trump está fazendo do jeito dele, mantendo os Estados Unidos longe dos brejos do Oriente Médio enquanto joga com o regime do Kremlin e Kim. Embora isso ressoe em um público americano cansado da guerra, é uma pedra no sapato os para intervencionistas neoconservadores e falcões liberais. Como o principal historiador, especializado em Rússia, Stephen Cohen, vem dizendo: “parece que os seguidores do “Russiagate” preferem cassar o mandato de Trump do que evitar a guerra nuclear”.
Há um duelo declarado entre membros do gabinete de Trump e Bolton. O conselheiro de segurança nacional é um guerreiro burocrático, habilidoso e experiente, mas ele não é páreo para Trump. O falcão republicano tentou sabotar o histórico encontro de Singapura com Kim e falhou. Bolton agora está jogando beijinhos para Vladimir Putin.
Então, para onde leva a política externa de Trump? Suas tarifas só aumentarão os preços ao consumidor e amortecerão o crescimento da economia global. Mas elas também podem ser uma tática de negociação para forçar os chineses a abrir sua economia para as importações do Tio Sam.
Os analistas de plantão na capital americana ressaltam que a política de Trump levará o país enfrentar sérios problemas em todos os setores. Mas essas são as mesmas elites que estiveram erradas sobre tantas questões na era pós-Guerra Fria (expansão da Otan, Iraque, Afeganistão, Líbia, China, GFC) que é difícil colocar muita fé em seus julgamentos e premonições. Afinal de contas, foram seus fracassos que ajudam a explicar porque o homem que elas tanto desprezam e odeiam está agora “pintando o sete” na Casa Branca.
* Freddy de Freitas é membro do Green Party e votou para Hillary Clinton nas eleições presidenciais de 2016