Por enquanto, o bombardeio de Lula não derrubou o muro do BC

Envolvendo-se em causas desgastantes - como o controle da Eletrobras e a revogação do Marco do Saneamento -, o Governo Lula e o PT, por mais que esperneiem, não conseguem derrubar o muro de contenção do Banco Central, que não dá sinais de quando vai reduzir os juros

Luiz Inácio Lula da Silva é presidente do Brasil - Foto: Ricardo Stuckert / PR

O Banco Central (BC) mandou um recado para o mercado e o governo de que tem pleno comando sobre a política monetária ao manter as taxas de juros em 13,75% e sinalizar determinação no combate a inflação. Com mais esta decisão fica claro que os objetivos do BC e do Governo Lula são opostos e sem condições de andarem juntos no curto prazo, mesmo em caminhos paralelos.

Sob os protestos do Governo Lula, o Copom (Comitê de Política Monetária) manteve a Taxa Selic em 13,75% – Foto: Beto Nociti / BC

O Comitê de Política Monetária do BC (Copom) mantém juros elevados para contrair os agregados monetários a fim de segurar o crescimento econômico e, com isto, provocar queda de preços. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defende uma redução dos juros e vem injetando recursos públicos na economia com o objetivo de estimular o crescimento da economia.

Os dois objetivos, porém, não cabem dentro dos instrumentos de política monetária do BC: controlar a inflação e promover a alta do PIB. Primeiro é preciso controlar a inflação, ou aceitar uma inflação maior, para depois crescer. A luta contra a inflação e juros altos é coisa antiga no Brasil, já comprometeu a reputação de muitos economistas ortodoxos e heterodoxos. O Plano Real conseguiu controlar uma inflação que castigava os pobres e assalariados, cujas rendas não tinham nenhum processo de indexação. As taxas de juros no Brasil, no entanto, sempre estiveram acima do patamar internacional pelo elevado endividamento e descontrole dos gastos públicos.

Debate antigo 

Ao centro, sentado e de terno preto, Ulysses Guimarães, presidente da Câmara dos Deputados, durante a promulgação da Constituição Federal de 1988 – Foto: Arquivo / Agência Brasil

Em 1988, as taxas de juros chegaram a ser tabeladas em 12% ao ano pela Assembleia Nacional Constituinte, como solução para a retomada do crescimento da economia do País. A emenda do deputado Fernando Gasparian (PSDB), estabelecendo limites para cobrança de juros pelos bancos, posteriormente promulgada pela Constituição de 1988, nunca chegou a viger. Primeiro, foi a Justiça que impediu sua aplicação. Depois, o Congresso Nacional retirou definitivamente o dispositivo natimorto do texto constitucional.

A discussão sobre o controle de taxas de juros voltou com toda a forca no governo de Luiz Inácio da Silva pela necessidade urgente de retomada do crescimento da economia. Lula, com a experiência de quem criou o Programa de  Aceleração do  Crescimento da Economia (PAC), sabe que o sucesso de seu governo depende do desempenho do Produto Interno Bruto (PIB). O equilíbrio fiscal, a geração de empregos e a queda dos preços dependem do crescimento da economia acima de 3% do PIB.

Programa de  Aceleração do  Crescimento, o PAC, é uma das bandeiras desenvolvimentistas do PT – Foto: divulgação

No segundo governo de Lula, depois de feito um ajuste fiscal e controle das taxas de juros, foi possível injetar os recursos do PAC e outros estímulos para a retomada da economia. O crescimento econômico contribuiu para elevar a arrecadação de impostos dando  equilíbrio fiscal à União, aos estados e aos municípios. O desemprego caiu, a massa salarial aumentou em um ambiente de inflação controlada.

Um pouco de inflação não faz mal 

O receituário dos economistas desenvolvimentistas, nos quais Lula continua apostando, é que com taxas de juros mais baixas e aumento do gasto público a economia volta a crescer. Com isto, melhoram as condições fiscais, os níveis de emprego e renda e, assim, a roda da economia gira com maior oferta de bens e serviços, e com preços civilizados.

Hoje, a inflação está fora de meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) devido a dificuldades de controle de preços e ao desequilíbrio fiscal. Com a paralisia da economia, devido às restrições impostas pela Covid-19 no setor produtivo e à injeção de recursos públicos para atender a população desamparada, ocorreu uma inflação de oferta e de demanda ao mesmo tempo.

Roberto Campos Neto é presidente do Banco Central – Foto: Raphael Ribeiro / BCB

Mesmo com juros de 13,75% ano, o Banco Central está perdendo a batalha para trazer a inflação para a meta de 4,5%, em 2023. O Governo Lula considera as atuais taxas excessivas pelos danos que causa ao crescimento do País. O argumento é de que estamos diante de uma inflação de oferta e subir os juros pouco efeito tem sobre os preços. Existe, ainda, a desconfiança de que o atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, segue a cartilha do ex-presidente Jair Bolsonaro, que foi quem lhe colocou no cargo e, junto ao Congresso Nacional, deu autonomia ao Banco Central para definir a política monetária.

Jogo jogado

Ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet – Foto: Edilson Rodrigues / Agência Senado

Com a autonomia dada a todos os diretores do BC para conduzir a política monetária, que neste momento acaba influindo na política econômica do governo Lula, não há outra solução para os próximos dois anos. Quando terminar o mandato dos atuais dirigentes do BC, o Governo Lula indicará os novos diretores que vão estar à frente da instituição nos próximos dois anos do governo. A única coisa que pode ser feita pelo atual governo para amenizar os  efeitos da política monetária sobre a economia é a alteração da meta de inflação no Conselho Monetário Nacional (CMN), onde os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, formam maioria.

A alteração da meta dando mais espaço para a inflação fornece à oposição o discurso de um governo que sanciona aumento dos preços, coisa que hoje assusta a população mais pobre. Há também um sinal negativo para o mercado financeiro e exemplos de descontrole da inflação, como o da Argentina. O efeito das elevadas taxas de juros sobre os preços ainda é parcial devido ao processo de injeção de recursos públicos na economia, ocorrido desde 2020, com a pandemia. A permissão para gastar dada pelo Congresso Nacional ao governo de Jair Bolsonaro, em 2022 e no início do governo Lula, tira parte do efeito contracionista da política monetária. É que, com mais dinheiro circulando na economia, há resistência da queda dos preços.

Mais juros = mais déficit = mais dívida

Fernando Haddad, ministro da Fazenda, concede entrevista à imprensa sobre medidas econômicas – Foto: Washington Costa / MF

O arcabouço fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em tramitação no Legislativo, em nada altera esta realidade fiscal. A promessa de um equilíbrio fiscal viria com corte de R$ 150 bilhões de benefícios fiscais concedidos pelo governo a setores empresariais e grupos econômicos organizados e com redução de gastos sobre parte dos ganhos de arrecadação, obtidos com crescimento da economia. Com razão, Fernando Haddad alerta que, se a economia não crescer e a manutenção das atuais taxas de juros, o déficit fiscal da União vai aumentar, assim como a dívida do Tesouro Nacional.

As estimativas mais otimistas são de que os juros podem voltar a cair a partir de agosto deste ano, dependendo do comportamento dos preços. Os economistas do governo Lula acreditam que os juros podem cair antes, uma vez que estamos com problemas de preços devido a uma inflação de oferta e, neste caso, o potencial dos juros elevados para combater a inflação traz mais prejuízos à economia do que benefícios, devido aos impactos que causa sobre o endividamento público.

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