O que é ruim sempre pode piorar. Mal deu para comemorar o apoio da maioria do STF ao correto parecer da ministra Rosa Weber, que anulou a bilionária maracutaia embutida em uma tal emenda de relator ao Orçamento da União, um guarda-chuva para todos os tipos de negociatas com votos de parlamentares. No Congresso, especialistas em afanar dinheiro público já elucubraram alternativas para manter a farra de sempre.
Nossa história mostra que desde que éramos colônia de Portugal o compadrio sempre foi um bom negócio. Virou matriz do que, com sobriedade ou escancarada, seguiu pelo Império e as várias Repúblicas adentro. Mesmo sendo carta marcada em todos os bons e ruins governos nas democracias e ditaduras, o que de vez em quando motivou reação nas ruas e nas urnas, persiste até hoje.
Em alguns momentos estimulou o combate à corrupção, com a aprovação de leis e padrões, que atribuíram competência ao Ministério Público, Polícia Federal, Receita Federal e a outros órgãos públicos no enfrentamento à bandalheira de sempre.
A Operação Lava Jato, que aprendeu o caminho das pedras com o Mensalão e outras investigações sobre o desvio de dinheiro público, escancarou o bilionário assalto aos cofres públicos por políticos de todos os quadrantes. Há de se ressaltar que, sob a batuta de José Dirceu, as gestões do presidente Lula expandiram o modelo de corrupção herdado de gestões passadas.
Essa é mais uma crônica de escândalos em sequência. À queda de Dilma Rousseff, em nome da moralidade administrativa, seguiu no governo Michel Temer uma farra ainda maior do Centrão com o dinheiro público — só para exemplificar, o ministro da Saúde daquela gestão foi o deputado Ricardo Barros, líder do governo Bolsonaro, e figura central nos escândalos apurados pela CPI da Pandemia.
Ricardo Barros antes havia servido a governos petistas e tucanos. Sua base política, que herdou do pai, é Maringá, no Paraná, de onde em caminho oposto veio também Sérgio Moro. Nessa madrugada, Ricardo Barros comemorou o sucesso da aprovação em segundo turno da PEC dos Precatórios, que abre os cofres públicos pro bem e pro mal no ano que vem: uma parte da grana vai bancar o necessário auxílio temporário aos milhões de famintos país afora e a outra se destina a financiar a dispensável farra eleitoral de Bolsonaro e de políticos de todos os naipes que tentam a reeleição.
Na contramão, ressurge Sérgio Moro. Ele se filia nessa quarta-feira (10) ao Podemos para entrar na corrida presidencial com o propósito de resgatar a bandeira da Operação Lava Jato, rasgada com o aval da maioria do STF que abriu o caminho para o liberou geral de notórios corruptos em todo o país. Um retrocesso que tem digitais: a aliança tácita entre os principais caciques políticos do país, com o argumento de que essa era regra do jogo, e a abertura da caixa preta misturou o joio com trigo. Alguns enriqueceram, outros fizeram vista grossa pra grana que bancaram suas campanhas eleitorais. São diferentes, mas foram misturados.
Essa é a questão que os atuais favoritos na corrida presidencial querem varrer pro baixo do tapete. Evidente que as questões econômicas e sociais, como a inflação e o desemprego, o criminoso descaso com a pandemia e outros fracassos na saúde e na educação, são o âmago de uma campanha eleitoral. Os costumes, em especial a moralidade e a corrupção, também.
Os times de Bolsonaro e Lula se preparam para uma guerra religiosa, buscando apoios de padres e pastores com influência entre os fiéis de suas religiões. Bolsonaro busca abertamente o apoio dos evangélicos. Lula cisca nesse mesmo terreiro (por mais que alguns evangélicos não gostem dessa palavra), mas segue em sua histórica parceria com a igreja católica.
Na ótica da elite política, a corrupção, que nos últimos anos mobilizou mentes, corações e abalou a mesmice do aparelho judicial, seria uma carta secundária na corrida presidencial. No máximo, um incômodo causado pela campanha de Ciro Gomes. A entrada de Sérgio Moro no jogo muda o patamar desse debate. Põe de novo a corrupção no foco.
Por si só isso é relevante. Se Moro cumprir esse papel, nem importa seu desempenho eleitoral. Na corrida presidencial também vai estar em jogo a reconstrução social, econômica e política do país depois da terra arrasada da gestão Bolsonaro.
Essa diversidade pode tornar a campanha eleitoral mais atraente e competitiva.
A conferir.