A revista Justiça & Cidadania publicou, no início desta semana, uma pesquisa do Instituto Quaest sobre a percepção do brasileiro em relação ao Poder Judiciário, em especial sobre o Supremo Tribunal Federal. O resultado em si não surpreendeu, mas revelou um profundo desconhecimento da população não só em relação ao funcionamento de um dos três poderes da República, mas sobre a própria Constituição Federal.
Mas o que mais chamou atenção na pesquisa foi a falta de noção dos brasileiros a respeito da principal lei que rege o país. Em determinado ponto da pesquisa, o entrevistador quis saber “o que é e pra que serve a Constituição Federal”. O resultado foi simplesmente desolador. Apenas 16% tinham conhecimento, os demais, 43% sabiam “mais ou menos” e 38% não tinham a mínima noção.
Embora esse resultado seja preocupante, explica muito do que estamos vivendo atualmente no Brasil. A pesquisa mostra que boa parte do povo brasileiro não tem conhecimento sobre seu papel de cidadão. É, talvez, por este desconhecimento, que nascem políticos populistas e personalistas, que se apresentam como salvadores da pátria e acabam sendo exaltados por parte considerável da população. Seus atos não são questionados e o senso crítico se perde em meio à idolatria.
É, também, por causa desse desconhecimento que nossa Carta Magna é vilipendiada com frequência sem que a população reaja e faça com que os poderosos recuem. Muitas vezes o desrespeito à Constituição parte de quem deveria defendê-la, como os poderes constituídos: Executivo, Legislativo e, principalmente, o Judiciário, que tem papel constitucional de seu guardião.
Um claro exemplo desse desrespeito à Constituição, cometido com frequência por parte do Executivo, é o excessivo número de Medidas Provisórias enviadas ao Congresso, sem observar o que estabelece o Artigo 62 da CF. De acordo com a regra constitucional, “em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias”. Quantas vezes esses requisitos são observados pelo mandatário da hora? Quase nunca. Grande parte das MPs assinadas não atendem a essas exigências. Poderiam muito bem tramitar como projeto de lei.
Mesmo projetos de lei, aprovados ou não a toque de caixa, podem desrespeitar a Constituição. São muitos os vetados em partes ou integralmente pelo Supremo. Nessa quarta-feira (3), o STF começou a julgar um jabuti na nova Lei de Improbidade Administrativa que, por seus efeitos retroativos, anula condenações como a dos ex-governadores Anthony Garotinho e José Roberto Arruda e livra da Lei da Ficha Limpa uma penca de políticos de todos os naipes.
O Congresso não se cansa de rasgar a Constituição, que parece ter virado xepa de feira. A maior prova é o número de emendas à Carta Magna já aprovadas, 125 ao todo. Somente no primeiro semestre deste ano foram promulgadas 11 novas mudanças ao texto constitucional. Algumas votadas a toque de caixa, como a que aumentou o valor do Auxílio Brasil e criou as ajudas aos caminhoneiros e taxistas, numa manobra do governo, com o apoio de políticos de todos os partidos, e que pode ajudar a campanha à reeleição do atual inquilino do Palácio Planalto.
A pesquisa da Quaest sobre o Judiciário ouviu 2.500 pessoas em 50 municípios de todos os estados brasileiros na primeira quinzena de julho. A população demonstrou total desconhecimento não apenas quanto ao conteúdo da Constituição, mas também em relação ao funcionamento e à necessidade da existência do Supremo Tribunal Federal. Segundo a pesquisa, 70% dos entrevistados não sabem o que faz o STF. Alguns já ouviram falar, mas não têm a menor ideia sobre quais são suas atribuições e sobre quais assuntos os ministros podem ou não decidir.
Com base nesse desconhecimento da população, as fake news sobre o STF ganham força. Afinal, quando se desconhece sobre o que está se falando, qualquer informação que surge, reproduzida aos montes nas redes sociais, parecer ser verdadeira. Se forem feitas pesquisas semelhantes quanto ao funcionamento do Legislativo e do Executivo é bem provável que o resultados sejam igualmente ruins. Ou piores.
O atual quadro é desolador. Pelo menos os detentores de mandatos nos executivos e legislativos federais e estaduais passam por escrutínio eleitoral daqui a 60 dias. Cabe ao eleitor começar a mudar uma infeliz realidade que, para ser profunda, depende de uma verdadeira revolução na Educação dos brasileiros, também assegurada pela pouco conhecida Constituição.
A conferir.