Michel Temer o anticandidato candidatíssimo

michel temer
Presidente Michel Temer.

Presidenciáveis abaixem as armas: Michel Temer não é candidato. Ele é anticandidato. Prometeu à dona Marcela que em 7 de outubro seu nome não estaria na telinha da urna eletrônica. Será mesmo?

Ulisses Guimarães costumava dizer aos críticos do então discreto presidente do PMDB paulista que Michel Temer era um político tão hábil que se fosse relojoeiro seria capaz de consertar um relógio de pulso vestindo luvas de box, rememorou o colunista Cláudio Humberto em seu blog. Boa lembrança do jornalista, pois não haveria melhor metáfora para descrever um presidente com quase zero de aprovação nadando de braçada no torvelinho multipartidário brasileiro.

E que dizer da candidatura de Temer, que será anunciada na Sexta Feira Santa? Segundo se sabe, o presidente não irá, na disputa, até o final do primeiro turno. Seu objetivo é ocupar na televisão o espaço eleitoral vago para “defender seu legado”. Como o MDB não vai se juntar a nenhuma candidatura no primeiro turno, ele vai usar o tempo do partido para falar de seu governo, de suas vitórias e, principalmente, não deixar sem resposta os ataques que sofrer. É o que ele diz, inclusive para dona Marcela, a quem jurou de pés juntos que não a exporia ao risco da ficar mais quatro anos na corda bamba.

Temer acredita que se não tiver uma tribuna será alvo para achincalhe de todos os candidatos, a exemplo de José Sarney, na campanha de 1989. A única forma se escapar do corredor polonês é reservar para si um espaço de tevê no horário nobre.

Neste quadro, Temer ocupando espaço irá até as vésperas da eleição, quando renunciará à candidatura, passando o bastão a seu delfim, o ministro Henrique Meirelles, que estará na chapa como vice-presidente. Então o goiano, que hoje se considera pouco conhecido, estará na boca do povo, livre das críticas diretas enquanto sua figura se espalha, pois é perda de tempo atacar candidato a vice. Então, na reta final do primeiro turno, com o horário do PMDB à disposição e com Temer, pseudocandidato, dando a cara a bater, o ex-ministro da Fazenda adentra fresquinho ao gramado, com a camiseta limpinha, como arma secreta para virar o jogo. Muito engenhoso.

O dispositivo de Michel Temer é muito adequado ao momento e ao posicionamento de seu partido na articulação da sucessão. A prioridade do MDB, sem candidato competitivo, o são as alianças regionais. Sua musculatura invejável nos estados visa ganhar e manter governos estaduais e bancadas fortes nas assembleias, Câmara e Senado. De pouco vale à mais poderosa agremiação entrar na eleição com um candidato “outsider”, um quadro alheio às suas fileiras, um nome popular que seja cooptado pelo MDB simplesmente para as eleições. Seja quem for.

Melhor de tudo é aproveitar que detém o governo nacional para fazer sua campanha de fortalecimento no poder em todos os demais níveis. Desta forma, mesmo sem chances de vitória, Temer será um ator de primeira linha, pois tem a chefia de um governo. Com a caneta na mão, mesmo que seja como candidato seja fraquíssimo, terá muita força numa eleição. Com o Palácio do Planalto no páreo, este tempo de campanha será o paraíso de prefeitos e governadores. Vai chover ambulâncias, pontilhões, equipamentos hospitalares, haverá de tudo que possa aparecer na foto. E Temer estará lá.

Não importa que não possa usar isto diretamente como amostra. Quem ganha com isto são os candidatos emedebistas aos governos estaduais, às câmaras e ao Senado. Mais ainda: os candidatos coligados com o MDB vão beber nesse caudal de recursos.

Este é o outro ponto fundamental neste momento: as alianças eleitorais. Embora o noticiário nacional se concentre nas cabeças de chapas para presidente da República e, no máximo, para governadores dos grandes estados, é na construção das alianças regionais onde se está definindo a composição política que vai dar a conformação final dos próximos governos. Pragmaticamente, é o que vale no quadro sucessório.

Por isto, tão logo anunciou a decisão de concorrer, a pré-candidatura do presidente paralisou o cenário. Ele não precisa se desincompatibilizar, é candidato natural. Ele tem o tempo que quiser para se manter como uma espada sobre o pescoço de adversários e de possíveis aliados. A seu lado, Henrique Meirelles se movimenta no tabuleiro, com uma liberdade invejável. Temer o anticandidato candidatíssimo. O doutor Ulisses deve estar dando gargalhadas na Eternidade.

E se tudo der errado e ele for chamado pela deusa da vitória? Como irá explicar à Marcela.

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Jornalista há mais de 40 anos na imprensa econômica, foi editor executivo da revista Exame, editor e diretor da Gazeta Mercantil, editor chefe do Jornal da Globo e diretor geral de Jornalismo da Rede Bandeirantes. Foi repórter dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo, das revistas Realidade e Veja. Na televisão foi integrante da bancada do programa Crítica&Autocrítica da Rede Bandeirantes e âncora do programa Primeira Página da TV Nacional de Brasília. Autor, dentre outros, dos livros “Os Senhores da Guerra” (L&PM Editores) e “Cem Anos de Guerra no Continente Americano” (Editora Record). Produtor e roteirista de longas-metragens.