Nordeste, o terceiro pilar de Bolsonaro

O Nordeste deve ser a terceira arma do capitão-mor Jair Bolsonaro para transformar as expectativas da campanha eleitoral num governo bem-sucedido. A deixa foi dada pelo general Augusto Heleno, futuro ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) do governo eleito.

General Augusto Heleno

Foi numa entrevista a’O Globo de domingo, 18, que o militar expôs a estratégia. “Tenho dito que o Nordeste é o centro das atenções para mudar o Brasil”, disse.

Augusto Heleno não é qualquer um. Trata-se daqueles aliados a quem Bolsonaro dá ouvidos.

O general reconhece que o Nordeste pode ser “vitrine”, embora aponte esta como preocupação “secundária”. Para justificar sua resposta, critica as ações públicas pregressas.

“Não acredito que as pessoas sejam tão infantis e continuem pensando em voto, em manipulação, em manter gente como coitadinha quando a gente pode fazer as pessoas terem outra perspectiva para o futuro”. Óbvia referência aos programas sociais que mantêm os mais pobres eternamente dependentes do Estado.

Mitos

Lula com nordestinos. Foto Ricardo Stuckert/PT

Bolsonaro não é Lula. Ambos são mitos para seus seguidores. Mas, enquanto Lula reina como demiurgo, Bolsonaro sabe que depende da inteligência de sua equipe.

Sem contar que a obra de Lula é palpável. A de Bolsonaro, uma promessa.

O capitão-mor já deixou explícita sua dependência ao reconhecer que não entende de economia e nomear seu economista de estimação, Paulo Guedes, como o Posto Ipiranga. A influência do faz-quase-tudo é tamanha que provocou um aparente cavalo de pau no pensamento do chefe, que saiu do estatismo militar-petista para a defesa da privatização, sonho de todos os liberais.

Eis que Bolsonaro fez questão de ter Heleno ao seu lado no Palácio do Planalto, centro do poder no Brasil. Logo, ao dizer que o Nordeste é “o centro das atenções”, o auxiliar catapulta a região ao terceiro pilar da futura gestão presidencial.

Há outros dois pilares para que a chamada direita se instale de vez no comando da Nação, após 6 eleições consecutivas onde a chamada esquerda foi a preferida dos eleitores. De Fernando Henrique, em 1994, à Dilma Rousseff, em 2014.

Como descrito aqui n’Os Divergentes, mais emprego e menos violência são armas indispensáveis de um eventual sucesso bolsonariano. Enquanto estas têm amplitude nacional, o terceiro pilar tem foco nos estados mais pobres do Brasil.

Falta d’água

Para a difícil tarefa de superar o PT na região, o novo mandatário deve mirar pouco mais de 20 milhões de eleitores nordestinos que sufragaram Fernando Haddad – derrotado no Brasil, mas amplamente vitorioso no Nordeste. Este contingente representa cerca de 52% do eleitorado regional.

Some-se a esta ampla maioria, cerca de 26% de eleitores que se abstiveram, anularam ou votaram em branco. São outros 10 milhões de eleitores a conquistar.

Seca na caatinga cearense. Foto Orlando Brito

Assim, o alvo do presidente eleito soma cerca de 30 milhões de eleitores nordestinos, ou 77% dos 39 milhões da região. Tarefa muito difícil considerando que os 9 estados do Nordeste concentram graves problemas na educação, na saúde e na segurança. E idolatram Lula.

Para isto, a receita do general (leia-se Bolsonaro) está desenhada. Primeiro, concluir a transposição do rio São Francisco.

Lula, Dilma e Temer executaram 96% da obra. Quando estiver completada, beneficiará 12 milhões de pessoas em 390 municípios de Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco, estados onde o PT de Haddad obteve expressiva vitória.

Na prateleira de bondades, ao lado da transposição, a dessalinização da água com tecnologia israelense. “O primeiro grande plano é resolver a falta de água”, apontou o general-conselheiro.

Ao lado do combate aos efeitos da seca está a Transnordestina, ferrovia que ligará a cidade de Eliseu Martins (PI) aos portos de Pecém (CE) e Suape (PE). Com 1.753 quilômetros de extensão passando por 81 municípios, a obra está pela metade.

Além disso, Bolsonaro anunciou que não acabará com o Bolsa Família. Ao contrário, vai ampliá-lo, concedendo o 13º salário, hoje inexistente.

Jugo paternalista

Mais emprego, menos violência e foco no Nordeste. Eis uma receita de quem pretende garantir o eleitorado que o elegeu, além de conquistar o que o rejeitou.

O presidente Figueiredo e o governador de Pernambuco Marco Maciel, ambos do antigo PDS. Foto Orlando Brito

Caso não se perca em temas paralelos, como o Escola Sem Partido, a chamada direita tem a oportunidade de romper o ciclo de 24 anos em que os eleitores escolheram a sinistra para governá-los (1995-2018) para além dos 4 já conquistados.

“O futuro presidente poderá seguir a trilha
da Arena, do PDS e do PT,
que mantiveram os mais pobres
sob o jugo do Estado paternalista.
Ou dar aos nordestinos o direito de serem livres do Estado.”

Na economia, cujo bom desempenho redundará em mais emprego, precisará contar com a habilidade de Paulo Guedes e seus Chicago Boys. Além dos votos da maioria dos parlamentares.

Na segurança, cujo objetivo é gerar menos violência e combater a corrupção, dependerá do sufeta de Curitiba. Hábil como juiz, Sergio Moro é um enigma numa função política como a de ministro de Estado, pois precisará do apoio do Legislativo e do Judiciário.

No Nordeste, cujo alvo é reduzir a desigualdade econômica e educacional, o sucesso dependerá mais de suas próprias ações. Se se esforçar muito e por longo tempo, poderá ir além do que foi Lula, o mais bem-sucedido mandatário na região.

A escritora cearense Rachel de Queiroz. Orlando Brito

Nas terras que geraram Ariano Suassuna, Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz e Jorge Amado, o futuro presidente poderá seguir a trilha da Arena, do PDS e do PT, que mantiveram os mais pobres sob o jugo do Estado paternalista. Ou dar aos nordestinos o direito de serem livres do Estado.

Como quase tudo que envolve Bolsonaro, uma incógnita a ser decifrada.

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