O terremoto do domingo já era esperado. Mas nem por isso deixou de derrubar paredes, abalar alicerces e fazer muitos desabrigados. Na ressaca da maior derrota de sua história, o PT tem uma única certeza, a de que precisa se reinventar. E, até lá, evitar a sangria de uma debandada que poderá deixá-lo menor ainda. Segurar esses quadros, sobretudo deputados e governadores, é a tarefa imediata dos principais dirigentes petistas nesse pós-eleição.
A melhor frase de petista do day after da devastação está veio do ex-ministro Miguel Rosseto, representante da Mensagem, uma das correntes mais à esquerda do PT, lembrando o Marques do Pombal no terremoto que quase acabou com Lisboa no século XVIII:”Agora é enterrar os mortos, cuidar dos vivos e tocar a vida”, disse ele ao Estadão.
Cuidar dos vivos é não permitir que eles debandem para outros partidos e projetos de poder – como pode ser o caso, por exemplo, do governador do Ceará, Camilo Santana, rumo ao PDT de Ciro Gomes numa aliança à esquerda para 2018.
Enterrar os mortos, porém, pode ser a tarefa mais difícil. São os companheiros que hoje, em Curitiba e em outros lugares, respondem pelas acusações de corrupção que ajudaram a levar o partido ao fundo do poço. Diferentemente do que ocorreu por ocasião do Mensalão – quando o discurso de distanciamento e repúdio garantiu a reeleição de Lula -, a maioria dos acusado vem recebendo a solidariedade do PT, sob o discurso de que tudo se trata de uma grande armação das elites para derrubar um governo popular e seu partido.
Ora, todo mundo sabe que não é bem assim. A corrupção na Petrobras e em outros lugares não começou com o PT e partido não inventou os esquemas dos quais é hoje acusado – aliás, junto com uma vasta gama de legendas, incluindo o PMDB e o PSDB, que o substuíram no governo. Mas o PT pecou, sim – errou, roubou, delinquiu, seja lá o verbo que for usado. E só vai se reconciliar com seu eleitorado, e até com sua alma, se reconhecer isso.
Sem acertar as contas de alguma forma com esse passado pouco meritório, vai ser difícil para o PT se reinventar. Admitir que errou e expulsar alguns por isso não é cometer harakiri.
É uma tarefa dificílima, mas não implica necessariamente em abrir mão da narrativa de que as investigações misturam o joio ao trigo e tem, de fato, alvos políticos que querem atingir a qualquer custo, como o ex-presidente Lula. Apesar de tudo o que se tem dito, não há contra Lula as provas cabais de corrupção que pesam contra outros petistas – o que permite ao partido adotar um discurso para preservar seu principal líder.
Essa tarefa de cortar na carne e ajeitar o discurso sobre corrupção não é suficiente para tirar o PT de sua maior crise, mas é necessária. Na segunda parte da estratégia, o tempo pode ajudar. O maior trunfo do PT, de dimensões históricas, é o seu legado social, de distribuição de renda e melhoria das condições de vida de milhões de pessoas.
É certo que muitas delas, premidas pela crise econômica e pelo desemprego, estejam temporariamente desmemoriadas hoje em relação a esses ganhos da era petista. Mas, a não ser que o governo Temer tenha um sucesso estrondoso em sua política de viés neoliberal – o que parece difícil em apenas dois anos – é bem possível que a memória do eleitorado comece a voltar em 2018, mas sobretudo lá para 2022. Muita calma nesta hora, portanto.