Quem circula no submundo das negociações partidárias não ficou surpreendido com as revelações da Folha sobre a malversação dos recursos do fundo eleitoral pelo PSL. Segundo essas fontes, o caso do laranjal pernambucano seria a ponta do iceberg da operação que levou Jair Bolsonaro e aliados ao partido. A direção do PSL , dizem, teria tido no mínimo 12 milhões de motivos para acolher o candidato e dar a seu então braço direito, Gustavo Bebianno, o posto de presidente da legenda durante a campanha.
Ninguém arrisca um palpite sobre o grau de participação, ou até de conhecimento, de Bolsonaro nos detalhes dessas negociações, travadas entre dezembro de 2017 e janeiro de 2018. Os principais interlocutores do acordo foram o próprio Bebianno, pelos bolsonaristas, e Luciano Bivar, pelo PSL. Mas o relato se encaixa perfeitamente na reação desproporcional, exagerada mesmo, de Bolsonaro e seu filho 02 às denúncias sobre o laranjal pernambucano – que, por si só, não parece ser motivo suficiente para o tamanho da crise que gerou no Planalto.
As ameaças nada veladas de Bebianno, que em entrevista à Crusoé chegou a dizer que o presidente estaria temendo que o episódio “respingasse” nele, jogaram mais lenha na fogueira. Não haveria muito sentido em que Bolsonaro tivesse medo de que respingassem nele acusações relativas a repasses de recursos a candidatas sem chances de ganhar em Pernambuco. Obviamente, o ministro se referiu a um esquema maior – que, quem sabe, poderia acabar revelando caso fosse chutado do governo depois de destratado por Carlos Bolsonaro e desmoralizado pelo próprio presidente.
É uma história que se repete a cada eleição. No caso, Bolsonaro havia acabado de quebrar a cara no PSC e no Patriotas e Bebianno acertou a ida do grupo, em bloco, para o PSL, que pertencia a um profissional estabelecido há muito tempo, Luciano Bivar. Na negociação, Bivar concordou inclusive em ceder seu posto de presidente eterno do PSL a Bebianno, mas apenas durante o período das eleições. Bebianno conduziu o partido e todas as negociações pertinentes durante o período combinado. A gestão do fundo eleitoral era uma dessas atribuições. Isso costuma dar brigas de faca.
Não dá para imaginar que Bivar tenha cedido seu posto vitalício por motivos ideológicos ou patrióticos. Deve ter havido negociação envolvendo dinheiro para campanhas, como se fazia na politica tradicional, à qual o PSL diz que não pertence mais. Quem conhece os caminhos dos recursos acredita que parte do pagamento teria sido feita com dinheiro do fundo eleitoral.
Como a lei eleitoral obriga que um percentual (5%) do fundo tem que ser aplicado em campanhas de mulheres, explica-se o gênero preferencial das laranjas. Podem ter repassado o dinheiro e as candidatas pagaram gráficas. Nada impede que tenham feito um punhado de panfletos para elas e também material de campanha dos verdadeiros candidatos. Com a possibilidade, inclusive, de superfaturamento para devolução, pela gráfica, de parte dos recursos para pagamentos de outros tipos de despesas (cabos eleitorais, por exemplo).
Quando a notícia estourou na Folha, Bebianno apontou Luciano Bivar como o responsável pelos repasses. Bivar negou e devolveu. Bolsonaro, quando viu o risco, se fez de desentendido e autorizou o filho a atacar o ministro, que reagiu.
É bem possível que a reforma da Previdência, que virou panaceia para todos os males da política brasileira, salve não apenas Bebianno, mas todo mundo. Se o ex-juiz Sérgio Moro quiser ir a fundo nas investigações que o chefe anunciou, porém, é possível que nem tenha muito trabalho. É só seguir o dinheiro, Moro!