O deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), o Paulinho da Força, sempre foi conhecido pela cara-de-pau. É daquele tipo que diz as coisas na lata, sem se preocupar com sua, digamos, correção política. Sua afirmação de que o Centrão deverá desidratar a reforma da Previdência para não “garantir” a reeleição de Jair Bolsonaro está hoje fazendo a festa dos governistas e defensores da reforma, que finalmente podem apontar agora por que as “forças do mal” não querem aprovar a Nova Previdência e juntá-las todas no mesmo saco.
O “sincericídio” de Paulinho, portanto, acaba sendo ruim para a oposição, que vem construindo um discurso contrário à Previdência politicamente muito mais palatável, baseado nas injustiças e nos prejuízos aos mais pobres.
É preciso, porém, fazer certa justiça ao Paulinho. Quem circula pelo Congresso já terá ouvido algumas vezes esse argumento, sobretudo de parlamentares ligados ao chamado Centrão. Não se trata de temor real, mas sim de uma estratégia política faz sentido num grupo comandado pelo fisiologismo e acostumado a chantagear governo após governo nas votações.
É uma bela conversa para boi dormir. De um lado, uma maneira de surfar na impopularidade de Bolsonaro, que parece crescente, e votar contra a reforma que acaba com privilégios de setores que fazem parte de sua base social, como os funcionários públicos, os delegados, os juízes e os próprios parlamentares. De outro, um aviso aos navegantes do Planalto de que vai sair, caro, muito caro, seu apoio à reforma.
Ou alguém acredita que a Previdência dará a reeleição a Bolsonaro? Nem dará, nem deixará de dar. Se for aprovada, vai agradar muito ao mercado e às elites. É possível, então, que o governo sobreviva razoavelmente nos seus quatro anos, sem tentativas de impeachment e outros golpes. Mas a recuperação econômica que os mais otimistas avizinham não viria de uma hora para outra, ainda mais depois dos últimos números, que mostram crescimento pífio e desemprego alto.
São, portanto, remotas as possibilidades de que, mesmo com a economia desejada de R$ 1 trilhão (em dez anos, vejam bem), a economia comece imediatamente a bombar, o povo a arrumar emprego e a renda a crescer.
A Nova Previdência não é um Plano Real, que, para felicidade geral da nação, acabou com a inflação. Nem tem nada a ver com as políticas de Lula e do PT que redistribuíram renda, deram acesso aos pobres à universidade, tiraram milhões da miséria. Ainda que a campanha publicitária que o governo vai deflagrar tenha os melhores resultados possíveis, levando a população a entender a reforma e considerá-la necessária, não há nada a comemorar ali para o bolso do cidadão comum.
Reeleição? Salvar as contas públicas e evitar o pior para o governo é bem diferente de gerar empregos e criar sensação de bem estar na população, embora, no longo prazo, as duas coisas podem acabar se relacionando. Só que isso leva tempo, e depende sobretudo da capacidade do governo de usar bem – e isso quer dizer usar em favor de todos, sobretudo dos mais necessitados – a suposta folga orçamentária que Paulinho tanto teme que venha com o ajuste. Reeleição depende disso. Até agora, o governo Bolsonaro não deu o mais leve sinal de ter condições de fazer isso.