Apesar de divergências em relação ao tom, aliados do presidente Lula avaliam que sua ofensiva contra o presidente do Banco Central já rendeu frutos e abriu o caminho para uma possível revisão da meta de inflação, hoje em irreais 3,25%. As opiniões se dividem no governo quanto à probabilidade de isso acontecer já na reunião do Conselho Monetário Nacional da semana que vem, mas há quem aposte no recuo de Campos Neto, ainda que na direção de uma mudança modesta de meio ponto ou 0,25%. Se, conforme essas previsões, o presidente do BC começar a piscar, todo o estresse terá valido a pena, na visão desses interlocutores presidenciais.
Ao chutar o balde dos juros altos, Lula corre um risco político: sai de uma posição tranquila, assegurada pelo apoio quase geral das forças políticas no pós 8 de janeiro, para assustar não só o mercado, mas sua base conservadora no Congresso — amiga desde criancinha da Faria Lima.
Ao mesmo tempo, porém, joga na rua um debate que estava interditado nos últimos seis anos de governos neoliberais, que é o questionamento ao garrote dos juros altos e seu impacto. Ao quebrar o tabu que inibia críticas ao discurso hegemônico do mercado na economia, despertou setores do empresariado e economistas que também não vêem sentido na atual política de juros — posições minoritárias na mídia tradicional ligada ao mercado, mas que começam a se fazer ouvir.
Da reação inicial de repúdio aos estouros de Lula, parte das críticas passam a se dirigir mais à forma de expressão da discordância em relação a Campos Neto do que ao mérito da questão dos juros altos estarem demais. Disso, pouca gente nos meios políticos discorda, ainda que não tenha coragem de expressar abertamente.
E vai se criando um ambiente propício à discussão econômica e técnica. Se, na reunião de quinta-feira que vem, o CMN —integrado por Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento), além de Campos Neto — sair com a decisão de ajustar a meta de inflação, não haverá surpresas nem choques.
É possível que Lula, ainda que correndo risco político, tenha optado por comprar essa briga agora para aproveitar o momento em que está forte politicamente. Sabe que não tem hoje maioria no Congresso para fazer passar qualquer medida efetiva para enquadrar o Banco Central, como algum projeto limitando sua autonomia ou mesmo um pedido de demissão de Campos Neto.
O que lhe resta, portanto, é falar — e, com isso, criar pressão de fora para dentro. Ainda que tenha apanhado um bocado do centro e da direita, cria um clima mais receptivo a mudanças, tanto no caso dos juros que podem frear o sonhado crescimento da economia quanto em outras matérias. É bem possível que esse continue sendo o método do Lula 3.0 de enfrentar um Congresso de maioria conservadora.