É quase certo que, hoje à noite, ouviremos um discurso de pacificação do presidente da República eleito. Serão palavras vazias se não forem acompanhadas de gestos concretos no curto prazo. Mas levaremos alguns dias para perceber isso. O que vai ser possível constatar, de imediato, será o tamanho da vitória – e da derrota- e os sócios que cada um terá nesse momento, o que já dirá muito dos tempos que virão pela frente.
Eu ganhei, nós empatamos e você perdeu – costuma ser o lema dos políticos logo após as eleições. Se vencer, Jair Bolsonaro terá poucas horas para fazer a definição crucial de seu governo: chamará as forças tradicionais e antigas da política brasileira, como o DEM e outros partidos do Centrão, por exemplo, para governar com ele? A turma está só esperando o chamado para participar da festinha, e levará como presente a chance de o capitão-presidente assegurar relativa maioria congressual.
Se a festinha ficar restrita à família Bolsonaro e seus amigos, o recém eleito poderá estar preservando a coerência do discurso contrário ao toma-lá-dá-cá, mas não estará avançando muito no rumo da governabilidade. Essa escolha definirá o destino do governo, e será balizada sobretudo pelos números finais da eleição. Se a vitória for apertada,
como se espera, dificilmente Bolsonaro se livrará dos braços do Centrão e ficará dependente dele para governar.
Se houver uma espetacular virada e Fernando Haddad vencer, também não voará em céu de brigadeiro. Afinal, nem o PT nem seus aliados se prepararam muito para vencer ao longo dos últimos dias, em que perdiam para Bolsonaro por larga distância nas pesquisas. Vai ser um deus-nos-acuda para compor uma base de sustentação e montar um governo às pressas.
Não é, segundo as pesquisas que fecharam a campanha, o cenário mais provável. Mas não é impossível. O que é bastante provável é que, num caso de derrota, a conta seja debitada sobretudo a Haddad. O petismo não se destaca muito pela solidariedade nessas horas, e a tendência é que, na disputa interna do partido, muita gente trabalhe para isolar o candidato e ficar com o comando do partido – e da oposição.
Da mesma forma, a derrota não unirá o campo da centro-esquerda, o Ciro Gomes deixou isso muito claro em seu retorno ao Brasil. A história poderá lhe cobrar essa responsabilidade se Bolsonaro vencer e seu governo for aquilo que muita gente teme. Mas o fato é que teremos campanha na oposição no dia seguinte à eleição, e com mais de um candidato.