Do sangue nos olhos ao soro caseiro, para que serve um vice?

Senadora Kátia Abreu - Foto Orlando Brito

O plantel de vices nas chapas presidenciais fechado neste domingo é um prato cheio para piadas e memes. Recebi um pelo whatsapp intitulado “Chapas puro-sangue”: “Ciro & Kátia: Sangue nos óio; Geraldo & Ana Amélia: Sangue do vampiro; Bolsonaro & Mourão: Sangue nas mãos”. Pelo jeito, interessante mesmo vai ser o debate dos vices.

Piadas à parte, pode ser engraçado, mas deve fazer pouquíssima diferença na ordem geral das coisas. Pelo menos até o próximo impeachment. Há dúvidas sobre as condições objetivas de os vices trazerem ganhos significativos às campanhas – até porque muitos deles são “soro caseiro”, integrando chapas puro-sangue, figurando ali para cumprir uma exigência da burocracia eleitoral.

Mas o processo de escolha dos companheiros de chapa dos candidatos presidenciais diz muito da lógica (ou da falta de) desse pleito estranho de 2018, das pressões sofridas por alguns, da falta de opções e do isolamento de outros. Vejamos o que é o (a) vice para cada um:

Alckmin quer a vice para tirar votos de Bolsonaro, mas não sai do sul maravilha – No caso quase único de Geraldo Alckmin, a indicação da senadora pepista Ana Amélia sinaliza fortalecimento. Depois da negativa do vice dos sonhos de todos, o empresário Josué Gomes – que acabou não sendo de ninguém – o tucano deu a volta por cima e agregou à chapa um nome respeitado ao sul e à centro-direita, que pode ter grande utilidade em sua principal estratégia: desconstruir Jair Bolsonaro onde tem mais votos. De quebra, a gaúcha pode transitar também no eleitorado de Álvaro Dias, outro responsável pelo crescimento tímido de Alckmin até agora. Na escolha, o candidato deixa de cumprir, porém, um quesito: a representatividade nacional de uma chapa presidencial. Com presidente de São Paulo e vice do Rio Grande do Sul, é complicado ganhar votos no Brasil profundo do Norte e do Nordeste.

Ciro arrumou uma vice boa de briga como ele. Brigas demais? – Depois de tentar alianças para todos os lados e acabar ensanduichado pelos movimentos que juntaram Alckmin ao Centrão e o PSB ao PT, Ciro Gomes ficou sem opções fora de casa. Restou no PDT a senadora do Tocantins Katia Abreu. Kátia não tem mais o comando do setor ruralista que tinha antes de ser ministra do PT e manter sua lealdade a Dilma Rousseff até o último momento, mas é um nome vistoso. É, sobretudo, boa de briga, o que aproxima seu estilo ao de Ciro. Talvez demais, dizem aliados, temendo o momento em que um poderá brigar com o outro.

Um general no isolamento do capitão Bolsonaro – De todos os descaminhos para chegar ao vice, talvez nenhum tenha sido politicamente mais danoso do que o de Jair Bolsonaro. A dificuldade em fechar alianças do primeiro colocado quando Lula é retirado do cenário é sintoma, acima de tudo, de que o mundo político não leva fé em sua candidatura. Por problemas partidários, perdeu a primeira opção, o general Augusto Heleno. Foi enrolado por dias pela histriônica Janaína Paschoal, que acabou dizendo “não”. Restava-lhe o príncipe Luiz Phillipe de Orleans e Bragança – opção bizarra que aprofundaria seu isolamento. Foi salvo pelo PRTB de Levy Fidelix, que cedeu-lhe o general Hamilton Mourão, dono de um discurso quase tão radical de direita quanto o seu. O deputado protagoniza, com isso, um exotismo que pode gerar ruído nas Forças Armadas: na chapa, quem tem que bater continência para o capitão é o general, hierarquicamente inferior na política.

Marina e seu vice alternativo ficam na floresta – Marina Silva também tem um vice mais ou menos à sua imagem e semelhança, o alternativo Eduardo Jorge, do PV. Um bom nome, acima e além das tenebrosas transações da política, mas que não amplia muito seu arco político.

Soro caseiro é remédio fraco para Henrique Meirelles- O candidato da maior máquina partidária do país, o PMDB, não conseguiu uma aliança consistente para lhe dar um vice fora de casa. O gaúcho Germano Rigotto é um político correto e um homem honrado, mas terá o efeito de um soro caseiro nas veias da candidatura Meirelles, insuficiente para curá-la da desidratação.

E Lula? – O problema do PT, que continua liderando disparado todas as pesquisas, não é o vice; é o candidato.

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