A cada dia fica mais difícil arrastar para qualquer lugar o corpinho liberal populista desse governo, em que uma perna insiste em andar para um lado, enquanto a outra já saiu correndo na direção oposta. O que terá levado a equipe econômica a propor o congelamento das aposentadorias dos velhinhos e a redução do alcance do auxílio para deficientes e idosos, a fim de financiar o Renda Brasil, depois de Jair Bolsonaro ter vetado a alternativa mais lógica de reduzir o abono salarial de quem está empregado?
Se a intenção era acabar com o Renda Brasil, um estorvo para esse pessoal que mexe com as contas públicas, conseguiu. Se era irritar o chefe, também. Bolsonaro acaba de ter um surto e dizer que está proibido falar em Renda Brasil até o fim de seu governo e que congelar aposentadorias e cortar auxílio de idosos e deficientes é “um devaneio de alguém que está desconectado com a realidade”. Mais ainda, disse que vai continuar com velho e bom Bolsa Família — aquele programa criado pelo PT que ele tanto queria chamar de seu com outro nome…
O presidente ameaçou com “cartão vermelho” quem, dentro do governo vier lhe trazer mais sugestões desse tipo, pois “é gente que não tem o mínimo de coração, o mínimo de entendimento de como vivem os aposentado no Brasil”. E ponto final. A quem se dirige Bolsonaro? É bom prestar atenção: o ministro Paulo Guedes não abriu a boca para defender tais propostas publicamente e ficou quieto no seu canto. Integrantes da equipe, como o secretário de Fazenda, Waldery Rodrigues, é que as anunciaram à imprensa. Podem ter virado bolas da vez — ou então arrumaram uma boa desculpa para debandar do governo diante da inviabilidade da agenda liberal, o que já estariam tramando ao esticar a corda. Esse, porém, não é o ponto mais importante.
A indagação que fica, neste momento, é o que fará Bolsonaro, que, com razão, não quer tirar do pobre para dar ao paupérrimo? Vai suspender os pagamentos do auxílio emergencial, já em R$ 300 reais, no fim do ano e não terá nada para botar no lugar sem o Renda Brasil ou outro programa similar que represente uma ampliação substancial do Bolsa Família. O programa traz ao imaginário da população os anos do PT, que o criou, e não tem a marca Bolsonaro.
Mais: ainda que seja ampliado para atender mais seis ou oito milhões de pessoas, além das 14 milhões de famílias beneficiadas hoje, não vai incluir a maior fatia dos 38 milhões de “invisíveis”, os trabalhadores informais que receberam o auxílio emergencial na pandemia. Em seu novo figurino populista, o presidente precisa encontrar uma solução urgente antes que sua popularidade comece a cair, o que se espera lá na virada do ano.
No desespero, dizem alguns, poderá se sentir tentado amputar a perna liberal do governo – Paulo Guedes e equipe -, ficando só com a populista. Uma jogada para lá de arriscada, que o fará cair sentado, sem o apoio que ainda lhe resta no mercado e no PIB. O Centrão, nessas horas, não ajuda ninguém a se levantar.