Com a inflação controlada, devendo fechar o ano em 3,3%, e a taxa básica de juros atingindo os níveis mais baixos da história, podendo chegar a 4,5% a.a. em dezembro, o Banco Central está bem na foto, do ponto de vista dos analistas econômicos e do mercado financeiro. Mas, no meio político, a admiração não é a mesma.
No Senado, Casa que tem entre suas competências privativas aprovar a escolha do presidente e dos diretores do Banco Central, o ambiente é pouco favorável para a autoridade monetária. O motivo é a percepção dos senadores de que, para os tomadores de crédito, os juros permanecem altos, sem falar nas taxas para quem cai no cheque especial ou comete o desatino de rolar dívida no cartão de crédito.
Quem pôde sentir de perto a insatisfação dos senadores foi o economista Fabio Kanczuk, que já serviu ao antigo Ministério da Fazenda e ao Banco Mundial. Indicado para diretor do Banco Central, ele foi sabatinado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) na terça-feira, 29.
Dos 27 titulares da CAE, quatro fizeram perguntas a Kanczuk, que obteve 19 votos a favor e quatro contrários, provavelmente daqueles que o inquiriram. Teve senador dizendo ao candidato: “Eu não tenho como votar no senhor.”
No plenário, o economista conseguiu 51 votos a favor e sete contrários, tendo havido ainda uma abstenção.
Senado vigilante
Nos debates, o líder do Governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) defendeu o Banco Central, apresentando dados fornecidos pela instituição, segundo os quais a queda dos juros já está ocorrendo para diversos segmentos, a exemplo do crédito imobiliário, com o mercado de crédito crescendo a mais de 10%. Segundo o líder do Governo, “pela primeira vez na história do Brasil, o crédito privado é superior ao crédito público em função da redução da inflação e da taxa de juros”.
Fernando Bezerra Coelho adiantou, com base em projeções de consultorias econômicas, que o crescimento econômico este ano vai ser superior a 1%, acrescentando que a política monetária conduzida pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tem um papel fundamental nisso.
Ele argumentou que o trabalho da instituição está em curso. Reconheceu a necessidade de o Senado permanecer vigilante para que o Banco Central possa atender à expectativa da sociedade brasileira, de modo que os juros cobrados dos tomadores de crédito possam ser trazidos a patamares favoráveis ao desenvolvimento do Brasil.
O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) disse concordar que o cartão de crédito e o cheque especial são dois absurdos, mas o absurdo maior, em sua opinião, está no financiamento do consumo e no financiamento das empresas. De acordo com o senador do Paraná, o spread bancário – a diferença entre a taxa de captação e a taxa de aplicação -, de dezembro do ano passado para setembro deste ano, subiu 3,2 pontos percentuais. Era de 17%, e pulou para 20,2%.
O senador Esperidião Amin (PP-SC) atribuiu os juros altos à cartelização do nosso sistema financeiro e à falta de um sistema cooperativo forte. Amin reclamou que o cadastro positivo, instituído por lei e considerado instrumento fundamental para reduzir os juros, não está produzindo os efeitos necessários.
Na avaliação do senador por Santa Catarina, Roberto Campos Neto precisa se comunicar e levar ao Senado alguma perspectiva concreta, informando se a economia está numa taxa de juro menor, se há uma expectativa de crescimento etc.
“O Banco Central deve comunicar a todos nós que há perspectiva de crescimento, que vamos poder contar com várias agências de crédito, não só os bancos, os quatro ou cinco bancos varejistas que nós temos, mas com bancos digitais, cooperativas, sociedade de garantia solidária, o emprestador autônomo, tão ansiado pelo microcrédito brasileiro. Isso precisa ser socializado”, disse Esperidião Amin.
O senador Rogério Correia (PT-SE) manifestou o protesto de alguns senadores e senadoras da CAE, porque votam em indicados para a diretoria do Banco Central com o objetivo de que possam organizar a oferta de crédito, que ele vê como fundamental em uma sociedade.
O senador aponta o que vê como uma contradição do governo: a ideia de se valer do investimento privado para alavancar a economia e para fazer o crescimento econômico. “Como?”, indaga. “Com essas taxas de juros?”
Limite para os juros na Constituição
Tramita na Comissão de Constituição e Justiça do Senado uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita as taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras a três vezes a taxa básica de juros estabelecida pelo Banco Central. Hoje, seria de 15% ao ano.
A PEC tem como primeira signatária a senadora Zenaide Maia (PROS-RN).
A iniciativa, claramente de populismo monetário, representa um retrocesso. O país levou anos para remover da Constituição o limite de juros em 12% ao ano, inserido no texto original da Carta e só removido em maio de 2003, no início do Governo Lula, quando uma PEC desregulamentou o artigo 192 da Constituição, que trata do sistema financeiro.
É pouco provável que a PEC da senadora Zenaide Maia vá adiante, mas indiscutivelmente, o Banco Central, do alto de sua boa performance, notada desde a chegada de Ilan Goldfajn ao comando da instituição, em 2016, precisa se comunicar com o meio político e, especialmente, com o Senado, onde os indicados para compor sua diretoria colegiada são submetidos à aprovação.
Estar bem com os analistas econômicos e com o mercado financeiro já não é o bastante.