A bola está na Câmara dos Deputados. Nesse momento do jogo, partida decisiva sobre a reforma da Previdência, Rodrigo Maia e seus parceiros do Centrão estão com tudo — além da bola, a prosa. Seus líderes deitam, rolam e projetam uma agenda própria para destravar a economia e tirar o país do atoleiro. Todos repetindo como mantra o diagnóstico de Rodrigo Maia. “O governo não ajuda muito porque o presidente Bolsonaro tem boa intenção, mas não tem projeto nem foco”, disse Aguinaldo Ribeiro, líder da maioria, em entrevista publicada neste sábado no Estadão.
Outros jornais publicam neste fim de semana o passo a passo dessa agenda do Centrão, batizada na capa da Veja como o Calendário Maia. Seria uma versão mais ampla da que foi saudada, em outras ocasiões difíceis, como o descolamento da economia da política. Dá gás a essa interpretação a alta rotatividade no Palácio do Planalto, onde a chamada articulação política virou um jogo de peteca entre políticos e generais. Agora nas mãos de um general da ativa.
Na ótica do mundinho político de Brasília, comprada pelo valor de face pelas elites país afora, Rodrigo Maia virou o dono do pedaço. Ele realmente tem feitos a contabilizar: 1) – É o principal condutor da difícil reforma da Previdência; 2) -Consegue o aval do mercado financeiro mesmo quando parece bater de frente com Paulo Guedes; 3 — Foi dele o pontapé inicial do cerco que, aos trancos e barrancos, tenta enfraquecer Sérgio Moro e conter a Lava Jato; 3) – Fez com que o próprio Bolsonaro reconheça agora que a balbúrdia palaciana no trato com o Congresso começou com a escolha de Onyx Lorenzoni — seu desafeto em seu próprio partido — para chefiar a articulação política do governo.
É uma considerável cesta de ativos. Esse jogo, porém, tem outras faces. No primeiro trimestre, além de claramente perdido, Bolsonaro parecia aturdido em suas novas funções. Virou esporte nacional, em especial entre os políticos, imprensa e o próprio governo, comentar o fiasco de seu desempenho. Coincidiu com o auge dos tumultos criados pelo clã Bolsonaro e pelo guru deles, Olavo de Carvalho. Depois de muita confusão, essa turma saiu dos holofotes e começou a colher vitórias, a principal delas a demissão do general Carlos Alberto Santos Cruz da Secretaria de Governo, apontado como o principal obstáculo à estratégia de devolver Bolsonaro ao palanque eleitoral.
A chave virou. Bolsonaro seguiu em desvantagem no Congresso, acumulando derrotas no Legislativo, por falta de traquejo, propostas ruins – algumas absurdas –, mas também por resistir ao assédio por cargos e verbas. A impressão difundida nesse embate é de que Bolsonaro está sendo engolido sem a menor resistência. Tenho ouvido que, sem alternativa, ele se agarra aos seus, apega-se a nichos sem maiores relevâncias, prega para convertidos.
Evidente que a sociedade é muito maior. Mas até para quem se opõe a Bolsonaro é bom ficar atento a seus movimentos. Desde que ele voltou para valer ao palanque, passou a cumprir uma agitada agenda diária com evangélicos, caminhoneiros, ruralistas, militares, jogos de futebol …
Nessa maratona vai se tornando um dos presidentes da República que mais fala à imprensa. Bate boca quase todo dia com o Congresso. Quando não tem do que se queixar, até inventa. Foi o caso de uma declaração nesse sábado que virou manchete em todos os sites: “Pô, querem me deixar como Rainha da Inglaterra? Este é o caminho certo?”. Justificou sua reclamação com uma suposta proposta dos parlamentares para passarem a indicar os dirigentes das agências reguladoras. “Imaginem qual o critério que eles vão adotar!”.
Bater no Congresso sempre foi fácil, mesmo quando os padrões ali foram mais respeitáveis. Na bagunça generalizada a partir do Centrão na Constituinte, os Anões do Orçamento, a venda de votos na emenda da reeleição, o Mensalão e a Lava Jato, a situação piorou. O voto de protesto, com impacto maior no Senado, mexeu forte também na representação na Câmara, mas ali não desfez o imbróglio. O poder continua com os mesmos.
Esse é o atual x da questão. O jogo ocorre na Câmara, o Senado só entra em campo no segundo semestre. A turma de Rodrigo Maia aposta no protagonismo nas reformas econômicas, e já conta com a confiança do establishment econômico, para se impor na queda de braço em Brasília. Um jogo em que poderiam até compartilhar um ganha-ganha com o governo. Mas só viável se a economia estivesse de fato descolada da política.
O Centrão e assemelhados têm foco. Querem cargos e verbas e algum tipo de salvo conduto. Daí a cobrança de participação no governo e a cabeça de Sérgio Moro, no mínimo algum freio a Lava Jato. É uma pauta que seduz o PT — obcecado pela bandeira Lula, livre — e atrai o apoio da oposição. O que se diz entre os caciques políticos é de que o senador Flávio Bolsonaro, encrencado em outra investigação, dá sinais positivos. O pai presidente é que ainda estaria vacilando.
Um jogo sem mocinhos.
A conferir.