Os falcões de Trump querem guerra com o Irã

Desta vez uma nova guerra no Golfo Pérsico foi evitada. Mas o clima beligerante paira sobre as areias dos desertos que escondem as maiores reservas petrolíferas do planeta

A julgar pelos últimos acontecimentos no Golfo Pérsico, Donald Trump prefere usar medidas de caráter comercial para conseguir alcançar seus objetivos estratégicos – seja por meio de sanções ou aumento de tarifas -, do que partir para a truculência das armas. Seguindo esse diapasão, Trump não dá ouvidos aos falcões da política externa americana, como o assessor de segurança nacional, o notório John Bolton, e o secretário de Estado e ex-diretor da CIA, Mike Pompeo.

Os dois pregaram abertamente atacar primeiro e conversar depois em crises como da Coreia do Norte, Venezuela e, agora, do Irã, localizado no Golfo Pérsico, região mais conturbada do mundo.

Neste fim de semana, o New York Times – um dos jornais de maior prestígio dos Estados Unidos e crítico acerbo de Donald Trump – publicou extensa reportagem relatando como foi a tomada de decisão do presidente dos Estados Unidos de não retaliar a derrubada de um drone americano por mísseis iranianos no Estreito de Ormuz, na última quinta-feira.

De acordo com o jornal americano, o conselho decisivo para que Trump não desse ouvidos aos falcões foi dado pelo apresentador da Fox News, Tucker Carlson. Nas 24 horas após a derrubada do drone, Trump se reuniu com a alta cúpula de militares, diplomatas e do governo para avaliarem qual a resposta adequada ao ataque iraniano.

Conselheiros bélicos

John Bolton

John Bolton e Mike Pompeu, mais uma vez, aconselharam atacar, quando ainda não estava clara a cadeia de comando iraniano que ordenou a derrubada do drone.

Na sexta-feira, pelo Twitter, Trump espalhou que cancelou a retaliação americana 10 minutos antes para “evitar a morte de 150 pessoas”, provavelmente militares iranianos na base de onde partiu o míssil que derrubou o drone. Os iranianos afirmaram que o artefato estava em seu espaço aéreo, mas os americanos alegam que o dispositivo militar estava em águas internacionais no Estreito de Ormuz.

A decisão não autoriza ninguém a dizer que Donald Trump teve um surto de bom senso no episódio, afinal foi o próprio que nomeou Pompeo e Bolton como assessores diretos em questões de política externa. Sempre se pode questionar ainda sobre como seria a reação se o míssil tivesse atingido um avião militar tripulado.

Mas o fato é que dessa vez Trump agiu corretamente.  Um ataque militar contra o Irã seria infinitamente mais desastroso do que a invasão do Iraque, em 2003. Os persas estão ali há milhares de anos e têm profundo orgulho de sua cultura, apesar da opressão e do puritanismo religioso dos aiatolás.

A menção ao Iraque é no mínimo furibunda, não só pela atitude militar dos americanos, como também pela participação do “falcão” John Bolton, na época um funcionário de segundo escalão em Washington. Bolton foi um dos mentores da invasão do Iraque.

Afirmava ter provas da existência de armas de destruição em massa por parte do regime de Saddam Hussein, a despeito da negativa da CIA e de membros das próprias Forças Armadas dos Estados Unidos. Na ocasião, alegou-se também que Saddam tinha feito uma aliança com a Al-Qaeda de Osama Bin Laden.

Ambas acusações foram desmentidas posteriormente. A mesma acusação surge agora contra o Irã.

Em busca da guerra

O drone americano

A derrubada do drone pelos iranianos foi o último ato de uma tensão militar que já vinha ocorrendo nas últimas semanas, quando seis petroleiros foram atingidos por minas ou sabotados. Mike Pompeo chegou a apresentar foto em que integrantes da guarda revolucionária do Irã – braço armado dos aiatolás, que opera sob as ordens de Ali Khamenei – supostamente colocam minas em um dos navios.

A via marítima do Estreito – por onde passa 30% do petróleo mundial – virou um cabo de guerra entre o Irã e os Estados Unidos nas últimas semanas. O regime iraniano começou a sentir os efeitos das sanções econômicas retomadas por Trump, que rompeu o acordo nuclear negociado por Barak Obama, potências ocidentais, além de Rússia e China em 2015.

O acordo previa que o Irã suspenderia por dez anos seu programa nuclear em troca da retirada das sanções. Donald Trump acha o acordo ruim e quer dobrar a aposta por um novo entendimento.

Mike Pompeo tenta convencer o governo e o Congresso americano de que os aiatolás estariam dando refúgio a integrantes da Al-Qaeda. Nada é impossível, mas quem acompanha o que acontece naquele conturbado canto do mundo sabe que muçulmanos xiitas e sunitas são inimigos mortais.

Se odeiam mais do que a Israel conjuntamente. A Arábia Saudita – berço do sunismo radical que gerou Osama Bin Laden e o Estado Islâmico – é aliada ao Estado judeu nos bastidores da sua luta renhida contra o xiita Irã.

Pode ter faltado “assessoria” a Pompeo, mas a sua acusação traz embutida uma carga de má-fé. O secretário de Estado fez um périplo pelo Congresso americano na semana passada. Nas entrelinhas, deixou a suspeita de que o governo Trump possa usar uma autorização do Congresso feita após a queda das Torres Gêmeas para declarar guerra ao Irã.

“Eles estão tentando buscar um argumento para permitir que o presidente faça o que ele quiser sem recorrer ao Congresso, e acham que a autorização de 2001 abrirá caminho para ele ir à guerra com o Irã”. Palavras do senador Tim Kaine, um democrata da Virgínia. Oposição a Trump, ele é membro da Comissão das Forças Armadas e Relações Exteriores do senado americano, que nos Estados Unidos é muita coisa, ao contrário de comissões congêneres em Congressos abaixo da linha do Equador.

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