Estamos mal de armamento, diz o presidente Jair Bolsonaro, como a desistir da invasão da Venezuela para depor o governo bolivariano. Faltou acrescentar: também nos falta dinheiro para pagar uma guerra.
Só a preparação de uma ação dessa envergadura demandaria mais de cinco bilhões de dólares, apenas na fase inicial de organização e montagem do dispositivo ofensivo. Seria o preço mínimo para botar em pé de guerra um Exército de 50 mil homens em terra, mais a Marinha e a Força Aérea, num tempo não inferior a dois anos de preparação.
Guerras geram cadáveres
Além disso tudo, levar essa gente toda para Roraima, não é só o preço das passagens e o transporte de armas, munições, remédios, esquifes (sim, nas guerras os mortos demandam caixões de defuntos) e alimentação adequada. Também terão de se alojar, mobilizar-se (combustível), acender a luz (desligando a Hidrelétrica de Guri fica difícil gerar eletricidade), e assim por diante.
Não são apenas as armas, que, como disse nosso presidente, estão em falta. As Forças Armadas teriam uma extensa preparação pela frente, antes de meter medo numa figura decidida como Nicolás Maduro e seus mil e tantos generais.
Em primeiríssimo lugar, seria necessário reabilitar o porta-aviões São Paulo e restaurar suas aeronaves de ataque (caças bombardeiros Douglas AF-1), compor uma esquadra de superfície e a força de submarinos para bloquear a costa venezuelana, enquanto as forças de terra atacam pela fronteira sul.
Outra demanda essencial será a entrega imediata dos caças Saab Gripen que Dilma Rousseff comprou da Suécia, pois nossa linha de frente de aviões supersônicos, os Northrop F-5, embora sejam as aeronaves mais bonitas que voam nos céus da América do Sul, não são páreo para os Sukhoi russos da Força Aérea Bolivariana.
Tem dinheiro, Guedes?
Assim, multiplique-se por 10 o custo inicial de cinco bi (em verdinhas). Será que Paulo Guedes tem caixa para segurar mais esta? (Custos estimados pela experiência americana no Afeganistão).
Portanto, para quem conhece a realidade, as ameaças do ministro Ernesto Araújo parecem que não se encontram com as teorias de Carl von Clausewitz sobre o segundo passo da ação política internacional (livro Da Natureza da Guerra, disponível nos sebos virtuais). O chanceler vai ter que ganhar na conversa.
Outra alternativa seria oferecer uma base para os norte-americanos em Roraima. Para os gringos seria um empreendimento mais trabalhoso do que armar o ataque ao Iraque, na Guerra do Golfo.
Naquele tempo, o Oriente Médio já era uma área de operações das Forças Armadas dos Estados Unidos. Tinham tudo ali pertinho. Assim mesmo eles levaram quase um ano instalando toda a parafernália de guerra.
Não basta levar soldados, armas e bagagens. O desenvolvimento do sistema das redes para comandar essas forças é mais difícil do que instalar o aparato bélico propriamente dito. Imagine como não seria essa jornada em pleno coração da Amazônia. Muito difícil.
A guerra é do Araújo
Claro que isto tudo são extrapolações e conjecturas, pois os generais brasileiros já disseram ao capitão Bolsonaro que “nem pensar” nessa guerra do embaixador Araújo. Nem mesmo um blefe. Ameaçar um vizinho é criar uma desconfiança insuperável.
É bom não esquecer que desde os tempos coloniais, quando os bandeirantes paulistas tomaram dois terços do atual território brasileiro dos espanhóis, que os países hispânicos sucessores têm o Brasil como ameaça. Não é bom reavivar essas brasas, nem de brincadeira.
Se a palavra é de prata, o silêncio é de ouro, diz o ditado. Nada de bravatas nem de ameaças a nossos vizinhos.
O petróleo já é deles
É bom lembrar que essa retórica de que os americanos querem o petróleo da Venezuela é uma grosseira bobagem. Os Estados Unidos já detêm o controle e são o mercado dessa produção desde 1919, ou seja, há 100 anos.
A questão é outra. Venezuela e Estados Unidos são farinha do mesmo saco, países da área do basebol. Nós somos do futebol.
Não vamos nos meter no campeonato deles. Nós não entendemos esse jogo. Fiquemos com nossa bola na rede.
(Para encerrar, ilustrativo lembrar que o presidente Jânio Quadros andou pensando em invadir a então Guiana Inglesa, atual Suriname, para anexar o Essequibo, um território também reivindicado pela… Venezuela).