Depois dos desastres do Carnaval, o governo desencadeou uma ofensiva para tentar melhorar o humor do establishment em relação às chances de aprovação da reforma da Previdência. Jair Bolsonaro correu atrás do tempo perdido, fez live no Facebook, passou a postar o assunto nas redes e chamou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, para um tete-a-tete no Alvorada sobre as nomeações para o segundo escalão.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, pressionadíssimo pelo mercado nos últimos dias, saiu a campo em entrevistas e conversas com parlamentares. Ocupou espaços na mídia do fim de semana. Na terça, estará na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.
O governo ainda precisa, porém, afinar sua viola, sob o risco de virar uma Babel e confundir toda a negociação com discursos erráticos e inconsistentes. Nas edições dos jornais do mesmo dia, por exemplo, choca-se o noticiário sobre a reunião de Bolsonaro e Maia para tratar (finalmente) dos cargos com uma entrevista em que Guedes diz que não haverá esse tipo de negociação e acena com a desvinculação total das verbas do orçamento da União.
A desvinculação das receitas, proposta que Guedes, lá atrás, chegou a aventar como “plano B” caso a Previdência não fosse aprovada, funciona, ao mesmo tempo, como um gesto para agradar e apavorar o Congresso. Agrada porque, em tese, caberia ao Legislativo controlar 100% do orçamento, em vez de apenas os recursos de suas emendas. Apavora porque tal mudança acaba com as exigências constitucionais e legais de destinação de recursos para cada área, como Educação, Saúde, etc. Mantidas as atuais condições de temperatura e pressão, não vai acontecer nem no dia de São Nunca. E vai provocar uma confusão tremenda.
Guedes também exagerou ao dizer que o governo já teria hoje na Câmara um placar mais ou menos favorável à Previdência, com cerca de 160 votos a favor e cem indecisos mas dispostos a votar, restando conquistar menos de 50. É óbvio que não tem, e dar falsas esperanças aos mercados é sempre um risco. Hoje a bolsa sobe e o dólar cai, amanhã, quando a previsão não se realiza, despenca.
Na real, a Previdência hoje não tem nem de longe os votos necessários para ser votada, e sua tramitação vai levar muito mais tempo do que os cronogramas otimistas do governo. Mas ela poderá vir a ter os votos e acabar sendo votada, ainda que com mudanças. Mas isso só vai acontecer se o governo parar de bater-cabeças, falar besteiras e recorrer ao velho toma-lá-dá-cá.