Se eu fosse um dos adversários de Jair Bolsonaro, lutaria com todas as forças do meu ser para que ele fosse representado por seu vice, general Hamilton Mourão, em todos os debates e sabatinas da temporada. Se, sem TV ou maiores exposições, ele já provocou um estrago nos últimos dias, imagine-se o efeito do general – que vem se revelando uma espécie de Bolsonaro à décima potência – diante de grandes audiências.
De uma só tacada, pode ter perdido, nesta segunda-feira, os votos de mais de 30 milhões de lares brasileiros que são chefiados por mulheres, número que só faz aumentar a cada dia. Só entre 2001 e 2015, ele saltou de cerca de 14 milhões para 29 milhões. Mourão disse, em palestra a empresários, que as famílias pobres, “onde não há pai e avô, mas sim mãe e avó”, são “fábricas de desajustados” que tenderiam a cooptados pelo narcotráfico.
Sim, ele disse isso. E, só para ficar no curto espaço de uma semana, disse também que o país precisa de uma nova Constituição, mas elaborada por um grupo de “notáveis” e aprovada em referendo popular, e não por uma Assembléia Nacional Constituinte, como mandam as regras das democracias representativas e dob Estado de Direito. No plano da política externa, referiu-se como “mulambada” aos países pobres e emergentes com os quais o Brasil intensificou relações nos últimos anos.
Há quem diga que o general Mourão é um vice forjado à imagem e semelhança do capitão Bolsonaro. Não é bem assim. Em seu discurso recheado de retrocessos políticos e comportamentais que defende, e que é apoiado pelos cerca de 20% da fatia mais conservadora da sociedade brasileira, o candidato do PSL sabe calibrar as coisas. Diz atrocidades e depois recua; fez gestos belicosos, inclusive com crianças de colo, e depois diz que foi “brincadeira”; revê posições anteriores e até votos. Afinal, 27 anos de mandato ensinaram Bolsonaro a saltar as cascas de banana da política.
Este não é, claramente, o caso de Mourão. Exibido ao natural num debate no horário nobre, o general poderá perder votos até do público direitista de Bolsonaro quando ele se der conta de que, um dia, poderá vê-lo sentado naquela cadeira do terceiro andar do Planalto, substituindo o presidente – em caráter temporário ou até definitivo. Não custa lembrar que Bolsonaro, no hospital até a véspera da eleição, tem ainda pelo menos uma cirurgia pela frente.
Exposto em largas doses, o general pisará em todas as cascas de banana e dificilmente conquistará aquela fatia do eleitorado que é antipetista mas ainda preza valores como a democracia e a igualdade entre homens e mulheres – essencial para que Bolsonaro saia do nicho mais direitista e amplie seu apoio, sem o que não terá condições de vencer a eleição.