Marina Silva, da Rede, e Ciro Gomes, do PDT, parecem estar acordando para a campanha – e despertaram cheios de disposição. Não se sabe se por começarem a comer poeira na largada ou se porque a estratégia era essa mesmo – embora seja quase hilário falar em estratégia política no Brasil dos últimos dois anos. O que une os dois adversários, de perfis tão distintos, é o risco concreto de que, no andar da carruagem, fiquem de fora do segundo turno com a aparente – e momentânea – polarização das intenções de voto entre dois extremos: o ex-presidente Lula, do PT, e o deputado-capitão Jair Bolsonaro, do PSC.
Ouvida pelo blogueiro do UOL, Josias de Souza, a ex-senadora desenhou um país quase sem saída. Segundo ela, o Brasil foi do fundo do poço – supostamente referindo-se a Dilma Rousseff – para o poço sem fundo – também chamado de Michel Temer. Chegou às profundezas, avaliou, porque tomou gosto pela polarização. Lula e Bolsonaro, nesse contexto, diz ela, “acabam sendo cabos eleitorais um do outro”. De certa forma, Marina repete, em sua terceira participação consecutiva em campanha presidencial , o tom de exorcismo que virou sua marca, esconjurando os adversários como sendo movidos pela ambição pelo poder, sem “projeto de país”.
Já Ciro preferiu, nos últimos dias, golpear mais forte o seu lado do espectro político. O pré-candidato do PDT – que já disse, ao se referir a Marina, que “o Brasil precisa de testosterona” -, dessa vez chutou o pau da barraca petista. Referindo-se às alianças regionais que o ex-presidente já vem costurando de olho em 2018, em particular em recentes imagens ao lado do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) durante passagem pelo Nordeste, Ciro disse que não cabe a Lula perdoar golpistas.
“Esse gesto de perdoar não toca a ele. O golpe não foi contra ele, foi contra a nação, a democracia. E ele se dá a faculdade, sendo candidato, de confraternizar com os golpistas”, fustigou Ciro, durante visita a Belo Horizonte. “Como vamos sustentar que houve um golpe de Estado no Brasil se ‘São Lula’ perdoou? Eu não perdoei”, canonizou.
Marina e Ciro têm patamares diferentes nas sondagens de intenção de voto. Na pesquisa estimulada do Ibope, a mais recente, em que os nomes dos candidatos são apresentados aos eleitores, Lula aparece com 35% contra 13% de Bolsonaro. Depois vem Marina, com 8%. Ciro aparece, atrás dos tucanos, com 3%. Na disputa presidencial de 2014, Marina quase chegou ao segundo turno, mas sua candidatura foi demolida pelo marketing da campanha de Dilma Rousseff. Ciro não chegou tão perto.
Ambos têm, porém, um problema em comum com Bolsonaro. Caso não consigam fechar alianças relevantes com outros partidos em torno de suas candidaturas, Bolsonaro, Marina e Ciro poderão largar atrás na corrida para o Planalto – pelo menos no tempo de TV, ainda um fator determinante. Uma projeção da divisão do horário eleitoral diário em 2018, feito pela Folha de S.Paulo, mostrou que, enquanto Lula teria 36 segundos, nos dois blocos – tarde e noite -. Marina ficaria reduzida a 23, Bolsonaro a 19 e Ciro a reles 10 segundos. A divisão do tempo de TV obedece a duas regras: 90% são proporcionais à bancada de deputados federais eleita pelos partidos e 10% são distribuídos igualitariamente entre os candidatos.
Se os eleitores vão atender às preces de Ciro e Marina só o futuro dirá. Ou a interferência divina – qualquer que seja a divindade, local ou global. Caso da pré-candidatura fantasma de Luciano Huck, que na prática não existe, mas vem sendo testada em pesquisas eleitorais, como fez o Ibope. A propósito, Ciro Gomes, nesta quinta, 9, aproveitou para exercitar sua conhecida verve ferina e língua afiada – o que o difere de Marina. “Tentaram lançar o prefeito de São Paulo, João Dória, já estão se decepcionando e vão tentar lançar o Huck. Logo mais, pode ser que o meu amigo Faustão possa ser considerado. A Ana Maria Braga pode ser (testada) também. Não nos esquecemos do Ratinho e do Datena, que eu admiro bastante”, ironizou. Pano rápido.