Pequenas e médias empresas são a bola da vez

Foto: Marcos Santos/USP Imagens/fotospublicas.com

O déficit orçamentário aprovado no primeiro trâmite em meio a um embate sem nexo dá ao governo o direito de se afundar sem culpa. É uma fórmula bem brasileira de implodir a responsabilidade fiscal sem enredar-se nas malhas da Lei.

Um último gancho da âncora que sustenta a precária estabilidade da economia parece mover-se no fundo lamacento do pântano. As reservas internacionais que sustentam o pouco de credibilidade podem ser chamadas as tapar buracos. Então teremos o fantasma da crise cambial. É o que falta.

As finanças públicas chegaram ao que o ex-ministro Antônio Delfim Neto chama de impasse aritmético: a produção não paga a conta. O guru de todos os governos, militares ou civis, faz uma de suas assertivas dizendo que os mentores do estado brasileiro escondem-se atrás de biombos ideológicos ou causas, que são discursos (no parlamento, na mídia e nos palanques) para sufocar a matemática.

Cobertor curto é metáfora clássica para este embate que se dá entre produtores e gastadores pelo excedente nacional. Na verdade, a briga já chegou ao nicho mais forte da queda de braço, os servidores do setor público: corta-se no custeio e poupa-se as pessoas. Cortam-se programas e preservam-se os funcionários.

Há uma blitz para revistar os bolsos de quem possa ter algum para irrigar a máquina.

As pequenas e médias empresas são a bola da vez.

A prorrogação da MP do Refis, que sai apressada da caneta provisória do deputado Rodrigo Maia e a outra face da mesma moeda da dívida, o Funrural: esse velho patacão é a expressão da grande carga fiscal que acorrentou os setores produtivos do País.

Os fomentadores de notícias envolvem a mídia com imagens de nababos sonegadores surrupiando centavos do fundo da bolsa família dos miseráveis. Antes fosse.

A realidade que se esconde é que os quebrados (inadimplentes na língua de tecnocrata) são os pequenos e médios dos três setores da economia: agricultura, indústria e comércio/serviços. Os grandes fazendeiros, os magnatas da indústria e os donos das redes de magazines também devem ao fisco, mas não são esses que estão emitindo o grunhido dos esgoelados.

A dança dos números nas artes de telas de tevê, dos notebooks das mídias sociais e, também do veículo mais poderoso para formar opinião, o velho papel de imprensa, sabe-se que esses gráficos estão ali porque o papel aceita tudo.

Os dados estão aí, publicados e falados. Entretanto há um vazio entre o que dizem articulistas, comentaristas, colunistas e repórteres especializados e as manchetes alarmantes. Parece que escrevem para cegos e falam a surdos. Essas informações não transitam.

Na prática, os governos, desde Dilma Rousseff, vêm secando cada teta da vaca. As fontes de financiamento secam uma a uma: primeiro raspa-se o fundo da panela de ouro da capacidade de a produção pagar impostos; outro vertedouro é a dívida pública, que também chega ao ponto de esgotamento; resta a emissão de moeda sem lastro, o combustível da inflação.

A inflação é o paraíso dos devedores (governo) e o tormento dos credores (investidores em títulos públicos e assalariados).

O anúncio de um aporte de 56 bilhões de reais na economia pelo Banco do Brasil é um sinal de que as impressoras da Casa da Moeda vão rodar à toda velocidade.

Completado o escorregador, pelo esgotamento das fontes de financiamento, os gestores e políticos que se preparem. O dragão da inflação vem aí cuspindo fogo.

Não obstante a ofensiva judicial sobre o setor privado, que se enredou em ações confessadas e inconfessáveis, os principais atores da administração pública já estão (muitos literalmente) algemados e maneados. Executivo (concursados e apaniguados) e legislativos perderam grande parte de sua capacidade de ação.  Entretanto, a economia não para, andando para frente ou para trás. Não pode ficar à deriva.

Com a administração pública e o legislativo atônitos, a insensatez está às portas. Como diz Delfim Neto (e outros colunistas lúcidos e capacitados): é o momento de descobrir os biombos e enfrentar a realidade.

O caso das dívidas dos produtores com o fisco é um primeiro embate que tende a penalizar os mais fracos nesse leque de interesses conflitantes. Como dizia o samba de Mansueto, “a fonte secou. Entre nós..”

Ainda não se chegou ao fundo do poço. Depois da inflação a crise cambial.

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