As ruas querem ter o controle. Só não sabem como

Manifestação na Esplanada dos Ministérios. Foto Orlando Brito

O Brasil está vivendo desde junho de 2013 inédito protagonismo das ruas. Desde então, movidos por sentimentos difusos, cidadãos se manifestam contra o establishment e todos que o representam.

Se é verdade que a história brasileira é recheada de manifestações populares, é certo que acabavam sendo encampadas pelo estrato político. De uma forma ou outra, partidos se apropriavam das inquietações populares.

Interpretar a história no momento de uma guinada não é fácil para quem dela participa, ensinou Eric Hobsbawn. Afinal, nem todos os momentos de ruptura são tão evidentes como o de 1945, quando artefatos atômicos dissolveram duas cidades.

Não é precipitado, no entanto, apontar o fim de um ciclo histórico no Brasil. Iniciado em 1985, com a derrocada da ditadura militar, findou-se em 2015, com o fim do período petista à frente da presidência da República.

Se há 31 anos a política era a esperança, agora ela representa o desalento. Embora majoritariamente reconheça a democracia como valor inalienável, a sociedade perdeu o entusiasmo na política como mediadora de conflitos inerentes ao sistema.

A autoanistia, com a qual os deputados, descolados da realidade das ruas, querem limpar suas fichas sujas, é reprise da desfaçatez que une quase todas as siglas. Noutros tempos, empurrariam a empulhação goela abaixo dos eleitores.

Desta vez, bastou que as ruas ameaçassem chiar para que o trio mais poderoso da política recuasse. Os presidentes da República, do Senado e da Câmara – Michel Temer, Renan Calheiros e Rodrigo Maia – renderam-se frente ao sinal de sublevação.

 

Caras Novas

A mudança ainda não foi toda contada, pois a história prossegue. Certo é que um punhado de figuras – algumas célebres, outras quase anônimas -, com a ajuda indispensável da internet, assenhoram-se aos poucos da força que acumulam.

O Estado de S. Paulo do último domingo, 27, estampou bem essa força ainda estranha e imensurável. “Contra caixa 2, grupos já ensaiam ‘Fora, Temer’ ” foi o destaque do matutino. Nas fotos que ilustravam a reportagem, caras novas no cenário nacional.

As lideranças políticas aqui ainda não perceberam que novo ciclo histórico já começou. Não estão sozinhas.

O Brexit, na Inglaterra, e a vitória de Donald Trump, nos EUA, são mostras de que os dignitários não estão vislumbrando a novidade. E se vislumbram, não entendem. A queda da presidente Dilma Rousseff não prosperaria sem a vereda aberta pelos protestos populares.

As caras novas, porém, vão aos poucos se apropriando de seu poder ainda inescrutável, mas real. “Vai depender de como Temer agir”, disse, segura, uma dessas novas lideranças admoestando o presidente sobre o risco de ele sancionar o projeto de anistia.

Enojados da política como sinônimo de locupletação, as caras novas vão aos poucos cercando o poder, buscando influenciá-lo. Só ainda não sabem como.

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