Segundo o Fórum Econômico Mundial, a habilidade, ou soft skill, mais importante que teremos de desenvolver para obter êxito na quarta revolução industrial é a resolução de problemas complexos. Como se faz isso? Se seguirmos o caminho óbvio, a sequência de passos será: analise as causas do problema/crie alternativas/avalie as melhores soluções/implemente o plano/avalie a eficácia. Porém, quando o assunto é resolução de problemas complexos estamos falando em lidar com situações nas quais as soluções que se conhecem atualmente não se aplicam.
Na minha vida profissional apareceram muitos problemas com essa característica de complexidade e eu diria que as etapas óbvias citadas, embora sempre importantes, raramente têm essa fluidez. Os problemas complexos podem vir de uma crise ou de uma grande oportunidade a resolver. Nas crises, o pau está quebrando e você tem que agir sem informação adequada, sem tempo, sem recursos e muitas vezes sem apoio. Rememorando situações desse tipo que vivi, os aspectos que mais impactam no surgimento do problema e na sua solução envolvem gente. Alguém entendeu mal, agiu errado, precipitado, desleixado, por incompetência, falta de informação, planejamento ou treinamento.
Herdamos de nossos ancestrais uma grande facilidade em aprender quando estamos assustados, lembra Daniel Kahneman no best seller Rápido e Devagar.
Quando o bicho pega e o problema cai no seu colo, a primeira coisa a fazer é ouvir, ouvir, ouvir. Já convivi com pessoas que não ouvem ninguém ou ouvem um e passam a agir imediatamente com assertividade, sem atentar para a frase famosa do jornalista H.L. Mencken: “para todo problema complexo existe uma solução simples, rápida e … errada”. Como afirmava o Conselheiro Acácio, personagem do Primo Basílio de Eça de Queiroz: “O problema das consequências é que elas vêm sempre depois”. As raposas políticas gostam de dizer que ficam roucos de tanto ouvir e muitas vezes é melhor não se precipitar e deixar o problema decantar. O travesseiro costuma reduzir muitos deles. A primeira-ministra britânica Margareth Thatcher dizia que aprendera uma coisa na política: você não toma uma decisão até que seja necessário.
Quando você ouve muito, passa a perceber qual é verdadeiramente o problema, que chega a você na forma de crise. Aí é a hora de lembrar de Mário Henrique Simonsen: “O problema mais difícil do mundo, bem enunciado, um dia será resolvido. O problema mais fácil do mundo, mal enunciado, jamais será resolvido”.
Os métodos disseminados pelos programas de qualidade no final do século passado continuam relevantes para procurar a causa fundamental do problema, para estancar a sua origem em lugar de atuar nas consequências.
Os treinamentos em negociação dão as dicas quando o problema envolve pessoas ou grupos de áreas distintas da empresa ou ainda entre empresas em conflito. Ouvindo muito vai dar para perceber as verdadeiras motivações. A primeira coisa a fazer é identificar os pontos de concordância, tirando-os da discussão e despoluindo o ambiente. Depois descubra os pontos mais sensíveis que cada lado não quer abrir mão. Por fim, se tiver de arbitrar dando razão a um dos lados, é fundamental dar uma saída honrosa para o perdedor, ensinava o Dr. Tancredo Neves.
A habilidade para resolver problemas complexos, de crise ou oportunidade, passa por uma grande dose de criatividade, muitas vezes reduzida ao etéreo e vago “pensar fora da caixa”. Para isso é preciso conhecer o mundo fora da caixa. Ajuda muito aprender sempre, observar muito, associar visões diferentes, manter um network diverso, transitar por campos diferentes da cultura. Ficou famosa a visita de Steve Jobs ao laboratório PARC da Xerox onde ele viu o mouse, a interface gráfica, os ícones, as janelas que lhe inspiraram na revolução feita na aparência dos computadores para sempre. Henry Ford tirou a ideia da linha de montagem para o seu Ford T de uma indústria de processamento de carnes, onde a desmontagem dos animais era feita a partir da suspensão das carcaças em um transportador aéreo que as levava de trabalhador a trabalhador, com cada um fazendo determinado corte.
Não é fácil identificar essa capacidade de resolver problemas complexos no recrutamento de um novo empregado. Na maioria das vezes isso aparece na prática.
O grande movimento atual para ampliar a diversidade dentro das empresas certamente ajudará muito a pensar o mundo complexo fora da caixa onde cada um nasceu, viveu e moldou seu pensamento.
Evandro Milet é consultor, palestrante e articulista sobre tendências e estratégias para negócios inovadores. Artigo publicado também no ES360.