Em meados da década de 70, a cientista política Elisabeth Noelle-Neumann formulou a Teoria da Espiral do Silêncio, após análise das pesquisas eleitorais na Alemanha. A ideia central é que as pessoas omitem sua opinião quando conflitantes com a opinião dominante devido ao medo do isolamento, da crítica, da zombaria, ou do que se chama hoje de cancelamento. O silêncio enfraquece ainda mais a opinião minoritária, e fortalece a opinião que parece prevalecer. A propaganda política (e as redes, robôs e fake news) tenta então convencer que determinadas opiniões são majoritárias na sociedade para abafar a opinião contrária, o que nem sempre é verdade.
As pessoas que concordariam com os que se calam ficam constrangidas e intimidadas e evitam se manifestar, em um crescendo nessa espiral do silêncio. Isso fica perceptível no Facebook em likes discretos que não se transformam em comentários. Há até uma expressão própria para essa síndrome, cunhada pelo psicólogo americano Michael Gervais: chama-se FOPO (“fear of other people’s opinion” ou medo das opiniões alheias)”.
Durante muitos anos no Brasil, esse silêncio acontecia na direita, sem canais para se manifestar, principalmente nos costumes, onde a Rede Globo despontava com uma pauta civilizatória de avanços, engolida a contragosto por essa ala. O crescimento do número de evangélicos e a violência descontrolada, que desaguaram na eleição de Bolsonaro, desnudou esse pensamento, cujos simpatizantes se acharam maioria e passaram a cancelar o pensamento contrário. O duelo de cancelamentos fez com que a espiral do silêncio atingisse duramente o pensamento de centro, ora classificado como isentão, ora acusado de petista por um lado. Do outro lado, era culpado de ter apoiado o suposto golpe contra Dilma e ter permitido a eleição de Bolsonaro ao deixar de votar no professor Haddad, como se o PT merecesse ser votado, apesar do partido ter comandado o maior roubo da história.
A espiral do silêncio que atinge as posições de centro nas redes sociais libera cada vez mais uma espiral de sandices pouco contestadas, onde mesmo as manifestações mais absurdas sobre terraplanismo, remédios ineficazes, teorias da conspiração e mentiras são propagadas e defendidas vigorosamente. Ao mesmo tempo, o desastre que acontece nas áreas da saúde, educação, cultura, meio ambiente, relações exteriores, ciência e tecnologia e direitos humanos é solenemente ignorado ou justificado. Do outro lado prevalece a espiral da amnésia seletiva e a falta de autocrítica das lideranças petistas, mesmo diante do imenso volume de recursos devolvidos a partir de delações que colocavam tesoureiros do partido recolhendo percentuais de propinas em mochilas.
A suposta atual maioria, que as pesquisas de opinião restringem a no máximo 25%, são turbinadas por uma malha de propagadores, humanos e robôs, centralmente alimentadas. Amigos advertem amigos sobre postagens contra o governo como se não fossem patriotas ou avisam que “está ficando feio”, falando de dentro da sua bolha, supostamente majoritária. A espiral do silêncio provoca também o voto envergonhado que desmoraliza pesquisas ou o voto em quem se imagina que vá ganhar, para “não perder o voto”.
O centro democrático tem o defeito de ser moderado e racional em uma época que valoriza os extremos populistas, os discursos radicais e o ringue do “nós contra eles”. Que 2022 devolva a voz ao centro com a moderação, o racionalismo, o iluminismo, o desarmamento de espíritos para que o país possa crescer forte, com menos desigualdade e mais pacificado.