Farda, fardão, camisola de dormir

Estamos em 1940, o exército alemão acumulava massacres pela Europa, tomada pelo terror da anexação nazista. E veio a tomada de Paris. No Brasil, repressão e tortura praticadas pelo Estado Novo de Getúlio Vargas, então ainda simpático ao projeto de Hitler. Não era o Getúlio que entraria para a história, mas é fácil deletar trechos de biografias. Nesse cenário, morre o poeta boêmio Antônio Bruno, abrindo uma disputa acirrada por seu substituto na Academia Brasileira de Letras. Dois militares disputavam a vaga: o coronel Sampaio Pereira, condecorado e simpatizante do nazismo, e um repentino candidato, o general Waldomiro Moreira, militar de varias glorias, mas tomado pela soberba.

Como aqui não é um espaço para crítica literária, só queria justificar o título desse texto civil, inspirado no romance escrito por Jorge Amado em sua casa em Itapuã, no final dos anos 70. A obra – e é isso que nos interessa aqui – é uma ode contra a opressão e a tirania. Entramos o túnel do tempo, sai a ficção, entra a realidade, e chegamos na convenção do PSL, no Brasil de Temer, de Lula preso, e da chapa pura-farda sacramentada neste fim de semana.

Se você já pretendia votar em Jair Bolsonaro porque ele vem da caserna, acha que a ditadura militar iniciada em 1964 foi um passeio no parque, relativiza a tortura, mas não perdoa os “terroristas de esquerda”, acha que direitos humanos é para “humanos direitos”, não entende de nenhum assunto que não envolva ufanismo, patriotismo e militarismo, confirme seu voto. Bolsonaro, depois de tentar de tudo, de uma advogada wicca, Janaína Paschoal, um herdeiro da família real, o príncipe Luiz Philippe de Orleans e Bragança, até o senador “Sinhozinho Malta” Magno Malta (PR), optou pelo que sempre chamou de “Plano B”. No caso, “D”.

Bolsonaro fala na convenção do PRTB

No caso, o general da reserva Hamilton Mourão. O capitão presidenciável terá um general como vice, um retrato desses nossos tempos esquisitos. E de sua absoluta incapacidade de fazer uma composição pessoal, imagine política. Bolsonaro espantou Janaína Paschoal! Pensem nisso.

Ah, Bolsonaro e Mourão têm um grande ídolo em comum: o falecido coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-Codi do II Exército, em São Paulo, torturador declarado. Imagine você, eleitor, diante dessas opções, qual seria o plano F de Bolsonaro. Só consultando o Necronomicon.

General do Exército, Antônio Hamilton Martins Mourão. Foto Divulgação/ Exército Brasileiro

O gaúcho Antonio Hamilton Martins Mourão, 64 anos, tem o histórico de um militar honrado, mas com o ranço – que julgávamos subjugado – dos remanescentes do golpe militar que ainda acham o poder civil algo a ser tutelado. Em 1964 como hoje. No governo Dilma Rousseff, durante uma palestra no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva (CPOR) em Porto Alegre, pregou que era preciso um “despertar para a luta patriótica” como saída para crise política do país. O popular golpe. Se aquilo era crise política, imagine você como chamar o que vivemos hoje pós-Temer. Decomposição política? O próprio Mourão, desta vez no notório Clube do Exército em Brasília, comparou depois o governo Temer a um “balcão de negócios”.

Não fez, obviamente, qualquer elo entre as consequências de derrubar uma presidente eleita democraticamente, baseado em “pedaladas fiscais”, e erigir a República tucano-emedebista com a ajuda de Eduardo Cunha, Renan Calheiros e dos meios de comunicação “tradicionais”. Parafraseando Miriam Leitão, no ponto eletrônico, um cartel que – menos o Último Hora – apoiou o golpe de 64.

O candidato Levy Fidélix

Além de Mourão, o domingo marcou a adesão de Levy Fidelix (PRTB) – você vai lembrar dele pelo bigode, pela semelhança com o anão Gimli do “Senhor dos Anéis” e pelas besteiras que disse na campanha passada – ao candidato do PSL ao Planalto. Levy Fidelix (PRTB) retirou sua candidatura à Presidência e oficializou sua candidatura a deputado federal. Uma foto antológica, do fotojornalista Renato S. Cerqueira, das agências Futura Press/Estadão Conteúdo, que mostra, lado a lado, Jair Bolsonaro – o único sem gravata, mão no peito em reverência cívica -, Levy Fidélix – o assecla do PRTB – e Hamilton Mourão -, tendo à frente um enorme arranjo de flores, pra mim, resume essa chapa. Se eu não soubesse que era a convenção do partido, diria que era um velório. Talvez seja. O cadáver na frente deles deve ser a democracia

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