Aloysio, o alienista

Aloysio Nunes

Enquanto não manda construir um manicômio para abrigar todos os esquerdistas da América Latina, o chanceler Aloysio Nunes Ferreira, o tucano ainda enfurnado no ninho peemedebista, segue em sua missão de vida: caçar bolivarianistas e comunistas no continente – aqueles mesmos com quem lutou, lado a lado, o guerrilheiro que aderiu ao quercismo e depois ao tucanato. Jogando dardos no belo mapa mundi que embeleza seu gabinete no Itamaraty, o chanceler fez esta semana sua maior proeza. Assumindo sua porção Dr. Bacamarte, Ferreira, cuja perseguição aos bolivarianistas merecerá um dia uma estátua em Washington, defenestrou na terça, 26, o encarregado de negócios da Embaixada da Venezuela no Brasil, Girard Antonio Delgado Maldonado. O sujeito agora é persona non grata e deverá deixar o Brasil. Que peste esse Maldonado!

Maldonado exerce o cargo máximo da diplomacia venezuelana no Brasil desde que Nicolás Maduro determinou que Alberto Castellar retornasse a Caracas. Isso ocorreu em maio de 2016, quando o Senado brasileiro aprovou a abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff. Agora, a ação da diplomacia brasileira foi uma retaliação à decisão da Assembleia Nacional Constituinte venezuelana que, no dia 23/12, declarou o embaixador do Brasil na Venezuela, Ruy Pereira, igualmente persona non grata. Outro defenestrado pelo governo Maduro foi o encarregado de negócios da Embaixada do Canadá, Craib Kowalik. Na semana anterior, ambos os países questionaram recente decisão da Constituinte de dissolver dois governos municipais – Grande Caracas e Alto Apure. Como se isso fosse assunto deles.

Por trás de tudo está a estratégia de isolar a Venezuela, esvaziando sua presença ou afastando-a de instâncias como OEA e Mercosul. Prócer do PSDB, vice de Aécio Neves na chapa presidencial derrotada em 2014, e apoiador e participante da deposição de Dilma Rousseff, Aloysio assumiu o Itamaraty depois de José Serra, que já havia marcado a inflexão na política externa brasileira depois dos anos de proximidade com os governos de esquerda pelas gestões petistas. A dupla não fez por menos: não desistiu enquanto a Venezuela não foi excluída do Mercosul.

“A suspensão da Venezuela deu maior liberdade ao Mercosul”, justificou, candidamente, Aloysio. Nesta estratégia de garrote, o Brasil tem preferido limitar sua atuação ao grupo de Lima, formado por 12 países, que, em agosto, concordaram em não aceitar decisões tomadas pela Assembleia Constituinte convocada por Maduro. Em setembro, Aloysio já havia recusado para o Brasil o digno papel de mediador no diálogo entre governo e oposição venezuelanos, negociado sob liderança da República Dominicana, por “ter um lado muito definido”. Tem mesmo. O embaixador brasileiro que terá que fazer as malas para sair de Caracas tem tramado, junto com os embaixadores do Chile, Pedro Ramirez, e do México, Erendira Paz, o que chamam de “diálogo sincero e produtivo com a oposição” a Maduro. Para bom diplomata, meia conspiração basta.

A sanção contra o diplomata venezuelano foi aplicada com base nas cláusulas do Protocolo de Ushuaia, de 1998, que exige a libertação de presos políticos, restauração de competências do Poder Legislativo, retomada do calendário eleitoral e anulação da convocação da Assembleia Constituinte na Venezuela. Ou seja, uma interferência direta na política venezuelana. Já pensou se o oposto fosse feito aqui? Bom, até se pensou nisso. Com o processo de impeachment no Congresso, Dilma Rousseff chegou a avaliar pedir a aplicação da Cláusula Democrática ao Brasil perante o Mercosul. Desistiu porque achou impróprio.

Em recente entrevista, o professor de Relações Internacionais pela UFABC e Doutor em Ciência Política, Igor Fuser, mostrou a incoerência de um governo como o de Temer emparedar Maduro como se lá houvesse uma ditadura. “Do ponto de vista da democracia, a Venezuela está anos luz à frente do Brasil”. Até o final do mandato-tampão de Temer, Aloysio deve conseguir trancar, ainda que metaforicamente, boa parte da esquerda da América Latina em seu cárcere particular, para escapar do “canto exato e novo” de que nos falava Belchior. Para, ao final, como todo mundo é louco, exceto ele próprio, o alienista tucano trancar-se sozinho na Casa Verde para o resto da vida.

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