Já faz muito tempo que isso aconteceu. Mas nunca me esqueci.
Mal havia chegado à Câmara dos Deputados e um excelente jornalista, que passou a me assessorar, fez-me decorar a lição: não repercuta o que a tenha incomodado no noticiário. Tudo quanto é repetido vira notícia outra vez.
Antes dessa lição, eu havia dado aulas de “Política Brasileira” no curso de Comunicação Social da PUC-MG, sob a batuta incrível do Professor Lélio Fabiano dos Santos. Em sala de aula, valia outra regra: repetir, repetir, repetir tudo quanto você percebe que seus alunos precisam aprender.
E fazer isso de várias maneiras: a sério, jocosamente, misturando histórias para obrigar alguém mais atento a chamar sua atenção. Fazer, enfim, qualquer coisa para os estudantes nunca mais se esquecerem daquela lição…
Captei a mensagem do amado mestre! Sempre fui estudiosa.
Mas apreendi, também, com muita naturalidade, a orientação de meu assessor brasiliense a ponto de, por várias vezes, tratar de engolir minha própria língua quando cruzava com o repórter, responsável pela notícia que me desagradara. Cheguei ao cúmulo de, simplesmente, não cumprimentar o jornalista que escrevera a tal da matéria, embora o conhecesse de longa data.
Na modorrenta sexta-feira de 17 de janeiro, quase caí desfalecida. Ao longo do dia, rádios, TVs, sites jornalísticos da internet repetiam à exaustão a fala do até então secretário Roberto Alvim.
Jovens e crianças pouco dados às lições de História nunca, decerto, haviam ouvido tanto sobre Joseph Goebbels, embora muito mais ainda devessem estudar sobre ele, o “gênio do mal”, nas escolas e universidades. Jornalistas repetiam “ad nauseam” o teatro de mau gosto de quem, até o dia anterior, antes de ser demitido, havia sido “o melhor secretário de cultura do Brasil de todos os tempos”.
Em se tratando de governo Bolsonaro, terá sido tudo isso proposital? Não sei. Só sei que um diretor de teatro que, antes de assumir um posto governamental, andava pelas tabelas, conseguiu que o mundo inteiro, sobretudo pelas redes sociais, ficasse a par de sua capacidade de competir com o artista alemão Ulrich Mathes (lembram-se dele em “A Queda”?) na arte de imitar Joseph Goebbels. Deu o seu recado.
Embora bata uma aposta que o boquirroto que nos governa não sabe qualquer coisa quando o assunto é nacional-socialismo, o que fizeram os difusores de informação foi uma verdadeiro festival de propaganda que faria Goebbels dar gargalhadas. Falem mal, mas falem de mim! Tudo isso tanto destoa da busca obsessiva de conteúdo de qualidade, como ensinava o mestre Lélio Fabiano, como diverge da orientação de meu querido assessor sobre como não fazer marola.
A questão, na era da internet das coisas, é: como se lida com um fato que quer virar notícia? O ex-ministro Marcílio Marques Moreira gostava do brocardo “suaviter in modus, fortiter in re”.
Nos tempos sombrios pelos quais passamos, repaginamos este ditado: divulgar de forma espalhafatosa coisas que “entendemos” superficialmente. Ou, se preferirmos Adoniran Barbosa, andamos divulgando e conversando sobre isso ou aquilo, “coisas que nóis não entende nada”!
* Sandra Starling é advogada e mestre em Ciência Política pela UFMG