A retirada de Lula

O ministro Celso de Mello, o decano do Supremo Tribunal Federal (STF), já lera mais da metade do seu voto quando o ex-presidente Lula desceu para a garagem do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo. Sem ninguém ao seu lado, além do segurança, e exibindo a fisionomia bastante cansada, Lula embarcou no carro e seguiu para o apartamento dele, a poucos quarteirões dali. Passara as últimas 10 horas no prédio de quatro andares que abriga a sede da entidade da categoria.

Àquela hora da noite em que Lula saiu sem ser visto, alguns militantes com camisetas vermelhas, integrantes do MST, duas senhorinhas com os casacos do uniforme laranja da Petrobras e outros resistentes eram o público que sobrara no Sindicato. No último andar, no restaurante, poucas mesas reuniam sindicalistas a discutir e, principalmente, a tentar entender o que acontecera.

Jornalistas que estiveram por lá desde a hora em que Lula chegou no final da manhã relatam que, mais cedo, quando havia expectativa e, principalmente, esperança de que o Supremo Tribunal Federal (STF) concederia o habeas corpus ao ex-presidente, mais de 500 pessoas estavam no prédio. Foram desaparecendo na medida em que os votos dos Ministros sinalizavam o resultado desfavorável.

No salão principal, o telão do palco, para o qual ninguém olha, continua exibindo o julgamento. A maior parte das cadeiras está vazia. Naquelas ainda ocupadas, a raiva deu lugar ao cansaço. Foi um dia intenso. Lula não saiu da área reservada onde, entre outros, estiveram a ex-presidente Dilma Rousseff, os governadores Wellington Dias (PI), Tião Viana (AC) e Fernando Pimentel (MG), além do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad.

Os militantes cochilam. Até que estoura uma saraivada de fogos de artifício faz todos saltarem dos lugares e correrem em direção às janelas:

– Não acredito que esses coxinhas tenham coragem de festejar – diz uma senhora.

– É agora que eu saio e encho esses caras de pancada – diz outro, exaltado, mas imediatamente convencido a continuar onde ele estava.

O carro do ex-presidente saiu pelas ruas desertas de São Bernardo e logo depois um comboio “fake” deixou a garagem. No mesmo instante, o deputado estadual José Américo Dias, fazia o último relato da noite aos jornalistas que também estavam encerrando uma longa jornada de trabalho. No andar térreo, poucos metros adiante da rodinha que eles formam para ouvir o deputado, uma das paredes exibe uma grande foto de Dona Marisa sorridente. Na lojinha de camisetas, ao lado, está pendurado o retrato oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Lá se vão 40 anos das greves dos metalúrgicos, entre 1978 e 1981, que entraram para a história do País. Lá se vão 40 anos, do tempo em que o metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva hipnotizava multidões no estádio da Vila Euclides. O dia 4 de abril já acabou. Nas primeiras horas da cálida madrugada em São Bernardo, uma viatura com dois policiais e meia dúzia de pessoas que esperam a condução ainda estão em frente ao prédio do Sindicato todo iluminado.

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