Pontos de crochê

A cronista nos conta que uma aula de crochê pode ser o caminho para falar às mulheres sobre de amor-próprio, autoestima e sororidade.

Venho de uma família de crocheteiras. Desde os 5 anos de idade tenho intimidade com linhas, agulhas e panos. Aprendi muito com os pontos, os nós e os laços que fazem parte da nossa caminhada.

Em momentos de alegria, teço. Em horas de dor, teço.

Aulas de crochê – Foto Divulgaçao

Meu crochê não é perfeito. Meu avesso tem remendos e buracos. Quando erro um ponto, não desfaço e, sim, tento aprender e dar um ponto por cima.

Com esta proposta de crochê pensante, dou aulas para mulheres de uma comunidade carente de Belo Horizonte. Chegaram tímidas, com mãos travadas, numa mostra da falta de coordenação motora fina, tão necessária na infância.

Eu estava de frente para mãos duras, calejadas e precisava oferecer a elas muito mais do que bicos em pano de pratos, caminhos de mesa ou forro de bandeja.

Logo no início uma delas desistiu e então falamos sobre persistência e que desistir também é resistência e nem sempre fracasso.

Mãe solo – Foto Divulgação

Em outra aula uma chegou triste porque o marido a deixou. Falamos das dificuldades que uma mãe solo enfrenta, de amor-próprio e autoestima. Falamos de amizade entre mulheres e gostaram do nome sororidade.

E agora vou falar da Shirley. Chegou tímida e trêmula, resultado do remédio para depressão. Seus pontos só não eram mais apertados do que seu coração doído pela perda de um sobrinho para o tráfico.

A mãe de Shirley lhe disse que ela não levava jeito para esta história de crochê, que isto era coisa de pessoas inteligentes e ela quase acreditou. Mas Shirley, quieta, insistia e eu guardava os pedaços tortos de seu trabalho.

– Para que você guarda estas ‘feiuras’? Ela me perguntava.

Eu costurei erro por erro, aprendizado por aprendizado e hoje mostrei para elas a bolsa de guardar sonhos.

Umas choraram, outras riram. Terminamos num abraço.

Foi bonito.

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