É só um pouquinho difícil de acreditar quando acontecem absurdos sob as cúpulas do Congresso, para tomada de atitudes pouco enaltecedoras do que tem acontecido por lá, de positivo, ao longo dos anos. A mais recente também não surpreende, pois entre políticos quase tudo é possível, havendo negociação. Agora uma excelência ousou lançar projeto de emenda constitucional com novas regras para a imunidade parlamentar, criando dificuldades para a prisão de deputados e senadores, além de outras punições, causadas por irregularidades por eles cometidas.
Sob o pretensioso nome de PEC da Imunidade, foi convenientemente apelidado de PEC da Impunidade, porque com ela aprovada todos imaginam que nada irá acontecer de punitivo aos faltosos.
De fato, o objetivo da proposta é aperfeiçoar a imunidade, tornando-a mais imunizante no sentido de maior proteção aos parlamentares, o que pode acontecer devido aos entendimentos das cúpulas partidárias. O presidente da Casa resolveu adiar a votação do projeto, enviado para debate nas Comissões, em busca de inspiração. Os parlamentares esqueceram do debate de outro tema importante para a sociedade: leis firmes contra eventuais falhas, ilegalidades, corrupção, desrespeito e outras anormalidades que acontecem na atividade parlamentar. Os abusos e irregularidades surgem em decorrência do protecionismo dos parlamentares.
Para atingir um bom nível de utilidade, decisão mais simples poderia ser adotada, e os brasileiros certamente iriam aprovar. O correto será extinguir o princípio da imunidade parlamentar. Simples e efetivo. Imunidade para ninguém que cometer faltas, atos criminosos, infração das leis, da Constituição, e quaisquer agressões à cidadania e aos direitos do já sofrido povo brasileiro. Portanto, é preciso eliminar a imunidade dos parlamentares que pretendem se colocar acima de todos os cidadãos, como privilegiados na sociedade. Importante seria uma punição mais radical aos faltosos, à prova de soltura por ministro do STF.
Pelos salões do Congresso não faltam parlamentares desqualificados aspirando à imunidade salvadora. Os últimos meses foram pródigos em revelações, mas só um dos criminosos recebeu punição imediata. O depufede Daniel Silveira (PSL-RJ), metido a valente, quase agrediu a mulher que lhe cobrou o uso da máscara contra a coronavírus, na própria delegacia de polícia. Ao final das ignorâncias se mostrou covarde e pediu desculpas à Câmara e aos brasileiros.
Queixou-se que estaria sendo perseguido e outras bobagens, já então amedrontado pelas reações às suas atitudes. O desqualificado deputado acha que merece a imunidade parlamentar. Mesmo querendo incendiar o STF, restabelecer leis da ditadura e promover atentados à democracia.
Há também uma parlamentar de maus princípios e fins, a deputada Flordelixo, (ex-PSD-RJ), pastora de uma igreja evangélica, que comandou o assassinato do marido, também pastor, na garagem de casa. Seus capangas deram mais de 30 tiros na vítima. Vai precisar de um calhamaço de imunidades para escapar à merecida punição, mas até agora conseguiu ficar livre. Boa parte dos deputados e senadores discorda da pretensão de liberalizar a imunidade parlamentar, optando pela extinção do dispositivo, e reconhecem que se trata de abuso de poder. Ao Congresso, uma casa de representação popular, não cabe usufruir de privilégios.
Há um terceiro pilantra, o senador Chico Rodrigues (DEM-RR) dos mais execráveis entre os que envergonham o Congresso e já deveria ter sido cassado por integrar o time da impunidade. Investigado por irregularidades financeiras, tentou enganar agentes da Polícia Federal em seu apartamento, escondendo R$ 30 mil na cueca. Que tinha bolsinho para moedas. Bandido e ridículo ao mesmo tempo. Ficou meses de licença e reassumiu a vaga, explicando ao presidente ter adotado o uso da carteira em vez da colocar dinheiro roubado na cueca. Não basta.
Esses tristes personagens são candidatos potenciais a se beneficiarem da futura PEC da Imunidade parlamentar, e aguardam a nova edição discutida nas comissões técnicas. Caso a iniciativa classista de outros setores trabalhistas desejarem lutar também por uma lei de imunidades nos seus setores de trabalho, o problema será generalizado. O Brasil já sofre de imunidades crônicas em vários setores.
— José Fonseca Filho é jornalista