De alguns anos para cá, vibrantes comemorações foram substituídas por comícios com sorteio de brindes para atrair populares. Até isso acabou.
Com 14,3 milhões de desempregados, outros tantos milhões de desesperançados ou desalentados e o movimento sindical enfraquecido por falta de recursos, o governo não se preocupa com manifestações de protesto.
O desemprego em massa exerce papel anestésico. As massas não tomarão às ruas para denunciar o insuficiente valor do salário-mínimo, a corrosão do poder de compra pela inflação, a alta dos preços dos produtos alimentícios, a falta de moradia. Quem está empregado agradece a Deus e fica calado. Quem não está, não dispõe de forças para se insurgir.
No Dia do Trabalho é impossível ignorar a figura ímpar do presidente Getúlio Vargas. Nesta data, em 1939, criou a Justiça do Trabalho; em 1940 instituiu o salário-mínimo; em 1943 aprovou a Consolidação das Leis do Trabalho. A Carteira de Trabalho e Previdência Social, no passado denominada Carteira Profissional, é símbolo do movimento trabalhista. Tê-la no bolso preenchida sempre foi motivo de orgulho para o operariado.
Ficaram célebres os encontros de Vargas com as classes trabalhadoras no Estádio do Vasco da Gama, no Rio de Janeiro, então capital da República, para os festejos do Dia do Trabalho.
No discurso do 1º de Maio de 1951, após retornar à Presidência da República pelas eleições diretas de 1950, disse Getúlio Vargas: “Esta festa de 1º de Maio tem para mim e para vós uma expressão simbólica: é o primeiro dia do encontro entre os trabalhadores e o novo governo. E é com profunda emoção que retorno ao vosso convívio, neste ambiente de regozijo e de festa nacional, em que nos revemos uns aos outros a céu aberto e em que o governo fala ao povo de amigo para amigo, na linguagem simples, leal e franca com que sempre vos falei. Nas horas de glória e de triunfo, assim como nas de sofrimento e de perseguições, os trabalhadores foram sempre fiéis, desinteressados e valorosos”.
Disse ainda: “Quando ouço o clamor dos vossos apelos mais prementes; calam-me fundo na alma o desamparo, a miséria, a carestia da vida, os salários baixos, o dinheiro que não chega para as necessidades mais inadiáveis, a luta contra a doença, o desespero dos desvalidos da fortuna e as reivindicações da maioria do povo que vive na esperança de melhores dias”.
Em 1º de Maio de 1952 o discurso teve como tema a importância política das classes trabalhadoras. No mesmo Estádio de São Januário Getúlio Vargas alertou: “O governo é um corpo vivo, e não um monumento de bronze sobre um pedestal. É o agente do povo e, nessa qualidade, cabe-lhe promover o bem-estar de todos e velar pelas necessidades da comunhão social. Um governo que se isola das massas populares está nutrindo, sem o saber, o germe de sua própria destruição”.
Em 1954, menos de 4 meses antes do suicídio em 24 de agosto, nas derradeiras palavras às classes trabalhadoras Getúlio Vargas, como se profetizasse, advertiu: “Há um direito de que ninguém vos pode privar, o direito do voto. E pelo voto podeis não só defender os vossos interesses como influir nos destinos da nação. Como cidadãos, a vossa vontade pesará nas urnas. Como classe, podeis imprimir ao vosso sufrágio a força decisória do número. Constituís a maioria. Hoje estais com o governo. Amanhã sereis o governo”.
Uma punhalada, desferida por alguém insano, contribuiu para o desfecho da última eleição presidencial. Frio, distante e indiferente ao sofrimento do povo, o presidente Jair Bolsonaro insiste em subestimar a crise e a pandemia. Despreza o número de mortos. Recordo que um dos primeiros atos de governo consistiu na extinção do Ministério do Trabalho, criado em novembro de 1930 por Getúlio Vargas.
O governo Bolsonaro não tem interlocução com os trabalhadores. Falta-lhe, ademais, canal específico de comunicação. Quem faz as vezes do extinto Ministério do Trabalho é o Ministério da Economia, comandado pelo burocrata economista Paulo Guedes, para quem o Brasil está quebrado.
Em 2021 a lembrança do Dia do Trabalho se reduz à Medida Provisória destinada a deter o desemprego. Em síntese, nada há para se comemorar.
— Almir Pazzianotto Pinto é Advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho