Com certeza os milhões de telespectadores da TV SENADO, que assistiram à eleição da Mesa Diretora, no último dia primeiro de fevereiro, devem ter se perguntado: “Ué estão usando cédulas de papel para eleição da mesa do Senado?”
A interrogação procede porque, como todos sabem, no Senado e na Câmara dos Deputados existem painéis eletrônicos para votação e cada parlamentar tem sua senha pessoal para votar.
Para entender a questão vale recordar:
“Em fevereiro de 2001, trechos de uma conversa de Antônio Carlos Magalhães com os procuradores da República Luiz Francisco de Souza, Guilherme Schelb e Eliana Torelly foram divulgados pela revista IstoÉ. Entre revelações e denúncias, o senador fez acusações contra o ex-secretário geral da Presidência Eduardo Jorge e Jader Barbalho, recém-eleito presidente do Senado Federal, além de criticar o governo de Fernando Henrique Cardoso. ACM também revelou ter a lista de todos que votaram contra e a favor de Luiz Estevão na sessão secreta que resultou na cassação do mandato do ex-senador, em junho de 2000, e ainda afirmou que a senadora Heloísa Helena, do PT, teria votado a favor de Estevão”.
“A suspeita de violação do sigilo do painel eletrônico do Senado Federal deflagrou uma crise que culminou com as renúncias de Antônio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda, na época líder do governo no Senado, em maio de 2001. Ambos foram acusados pelo Conselho de Ética de quebra do decoro parlamentar. Os dois negaram envolvimento no caso, mas Regina Borges, então diretora da empresa de Processamento de Dados do Senado, confessou que a lista dos votos foi entregue por ela mesma a Arruda, a pedido do próprio senador que, em seguida a mostrou a ACM. Para evitar a cassação de seus mandatos e a consequente perda de seus direitos políticos, Antônio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda renunciaram ao cargo de senador.”
Então é por esta causa que na eleição mais importante do Senado se usa a cédula de papel que é depositada na urna que fica sobre a mesa à vista de todos e pela certeza de que ninguém consegue manipular os votos e fraudar o resultado da eleição.
Mas mesmo assim, entre as velhas raposas, como Andrei Meireles, um dos autores das reportagens de IstoÉ sobre a violação no painel eletrônico do Senado, nos relatou n’Os Divergentes , em 11 fevereiro de 2019 “grupos de Renan e de Alcolumbre se acusam por fraude no Senado”, em uma votação com cédulas de papel.
Em meio a essa antiga polêmica, o projeto de lei 5735/2013, de autoria dos deputados federais Ilário Marques (PT/CE), Anthony Garotinho (PL/RJ), Daniel Almeida (PCdoB/BA) e Marcelo Castro (MDB/PI), se transformou na Lei 13.165, de 29 de setembro de 2015. A presidente Dilma Rousseff, sob alegação de que a mudança para impressão dos votos custaria R$ 1,8 bilhão, vetou parcialmente o projeto. Mas, com os votos de 368 deputados e de 56 senadores, o veto foi derrubado, ficando assim fixado em lei que a urna eletrônica também imprimiria no papel o registro de cada voto, que seria depositado em local lacrado, sem contato manual do eleitor. Essa regra deveria começar em 2018.
Levada a questão para o STF, este, por 8 x 2 (votos contrários de Gilmar Mendes e Toffoli), declarou a inconstitucionalidade da lei e mais uma vez, como insegurança jurídica, continuou a polêmica.
Tudo o que aconteceu no espetáculo dantesco de barbárie e inconformismo no último dia oito de janeiro, em Brasília, em boa parte se deveu a esta falta de transparência do nosso sistema eleitoral e, o mais intrigante, é que ficará na história desta República como o maior processo penal já registrado e com o maior número de réus denunciados e incrivelmente até agora se prenuncia instância única, vale dizer, sem meios de recursos.
Não se pode esquecer que esta eleição de 22 custou aos cofres públicos mais de 6 bilhões de reais (5 do Fundo Eleitoral e 1 de isenção de impostos as TVs para cederem tempo ao horário eleitoral), além dos caixas dois que de fato existem e abusos de poder que são usos e costumes da reeleição.
O que podem nos dizer os senhores parlamentares, principalmente os novos senadores e deputados que chegam no Legislativo, que o nosso sistema de votação questionado desde o tempo do falecido Leonel Brizola deve continuar o mesmo? Quanto ao Lula, conseguirá estabelecer a reconciliação que pregava na campanha, depois vandalismo de 8 de janeiro?
Por todas estas importantes questões que continuarei, não mais como político, mas cidadão, pregando uma ASSEMBLEIA CONSTITUINTE EXCLUSIVA.
* Nilso Romeu Sguarezi é advogado. Foi deputado federal constituinte de 1988. É defensor de uma Assembleia Nacional Constituinte Exclusiva