Assisti aos debates da Globo, tanto com os candidatos a governador do DF quanto com os candidatos a presidente.
Dentre tantas bizarrices, contradições, deselegância, falta de educação e mentiras, um fato me causou intriga: o que faz com que um candidato se autodenomine um representante da direita?
No debate entre candidatos ao governo do DF, o tal coronel Moreno colocou Ibaneis, Paulo Otávio e Izalci no mesmo balaio da esquerda ao se arvorar como o único candidato da direita. Pelo que entendi, para ser direita, segundo seus valores, a pessoa tem que fazer parte das forças de segurança. Só isso o difere dos outros citados.
No caso dos presidenciáveis, os autoproclamados representantes da direita eram Bolsonaro e o tal do Kelmon (me recuso a chamá-lo de padre). Até Soraya Thronicke, do União Brasil, foi considerada esquerdista. A que ponto chegamos?
Os candidatos da dita direita abusam do nome de Deus e se dizem defensores da família. Como se os outros pregassem o seu extermínio.
Quando se tem mais emprego, mais moradia, mais comida, mais crédito, mais educação, saúde de qualidade e melhores condições de vida, mais chances têm de as famílias continuarem juntas e felizes. O que mais destrói casamentos são problemas e falta de estrutura para manutenção dos entes familiares.
Os representantes da direita se dizem contrários à ideologia de gênero, embora, quando questionados, não saibam precisar exatamente do que se trata. Mas, vamos lá, pelo que entendi eles acham que as escolas estão sexualizando as crianças. O que tem de real e concreto em relação a isso? Alguém saberia dar um exemplo? Me parece que isso é apenas mais uma das fake news inventavas para amedrontar os autoproclamados conservadores.
Quem se considera alinhado ao pensamento mais à esquerda, certamente respeita a orientação sexual das pessoas, primeiro porque não se trata de escolha, segundo porque não muda nada a vida de ninguém o fato de alguém gostar de alguém do mesmo sexo.
Os conservadores de direita dizem respeitar as “escolhas” alheias desde que sejam discretos, de preferência que se escondam em casamentos héteros de fachada.
Para eles, bastaria proibir um punhado de coisa e o mundo seria perfeito. São contra drogas, aborto, criminalidade. E alguém é a favor?
Não vivemos num quartel, onde qualquer desvio é severamente punido e as pessoas acabam sendo enquadradas. Caso decidam continuar se rebelando, acabam sendo expulsas, como aconteceu com o Jair no Exército. Péssimo exemplo para os defensores dos bons costumes e da obediência.
O rabino Nilton Bonder, em seu livro Alma imoral, explica que o mundo só evoluiu porque sempre houve transgressores. Se ficássemos por conta dos defensores da tradição, talvez estivéssemos ainda na idade da pedra. Ele mostra que os conservadores também são importantes porque senão o mundo mudaria rápido demais e é melhor que as mudanças se deem aos poucos.
Talvez seja essa a melhor definição para os autodenominados de direita: são pessoas que estão aí para olhar para trás, tentar recuperar o passado e retardar a evolução do mundo.
A boa notícia é que, com eles ou sem eles, o novo sempre vem. É só questão de tempo.
– Cláudia Abreu é jornalista