Independentemente da decisão que o Supremo Tribunal Federal adotar sobre a prisão de condenados em segunda instância, já podemos chegar a uma conclusão. A presidente do STF, Cármen Lúcia, não tinha a menor necessidade de ficar dizendo, um dia e no outro também, pela televisão e pela mídia, que ela não faria isso nem aquilo. Càrmen Lúcia, segundo ex-ministros do STF, deixará como herança de seu mandato um “prejuízo definitivo” à imagem do Tribunal. Ela não precisava dar uma de “machinho” e ficar afirmando que não faria isso, não faria aquilo.
Mesmo que o julgamento desta quinta-feira tenha sido marcado contra a sua vontade, a prisão de condenados em segunda instância será debatida pelo Tribunal. Ex-ministros do Supremo arriscam a prever uma mudança de posição, derrubando a liminar que permite a prisão desses condenados, entre eles o ex-presidente Lula. Isso equivale a dizer que a autoridade da ministra cairá por terra e que ela não representa mais a maioria dos ministros que a elegeram.
Adotando uma licença poética, poder-se-á dizer que ela, na prática, acabará sendo destituída. E que vai vagar como fantasma durante os anos em que permanecer no Supremo. Ela proclamava que não se renderia às pressões, mas na visão da opinião pública ela terá se submetido a estas pressões. E o que é mais trágico, colocará na condição de submissos às pressões os demais ministros do Tribunal, sobretudo os que votarem contra a posição dela.
Serão apresentados como submissos os que defendem, como o decano Celso de Melo, o respeito à Constituição, que diz que somente depois de uma decisão que não caiba mais recursos (trânsito em julgado) se poderá decretar uma prisão.
A posição jurídica de Cármen Lúcia sobre o tema não pode ser comparada ao seu comportamento nesse processo. Ser contra ou a favor de qualquer proposição é uma deliberação de natureza jurídica que merece respeito, independente das convicções individuais de cada um de nós. Mas ao tratar de procedimentos, ela adotou um discurso de natureza política. Cármen incorporou o Marechal francês Philipe Pétain, na batalha de Verdun durante a Primeira Guerra Mundial, e ficou gritando: “Não passarão!”. Passaram!
Ela tentou estabelecer uma linha divisória entre certos e errados ou bandidos e mocinhos. O resultado é que ela perdeu o controle do processo e, agora, cada torcida elegerá quem são bandidos e quem são mocinhos, os que estão certos e os que estão errados. O Brasil mudou. Foi-se o tempo em que os ministros do STF se manifestavam nos autos. Hoje, eles se manifestam pela televisão. Luz, câmera, ação!