O day after do coronavírus

O mundo vai acabar, mas não agora

Crises inéditas, como a do coronavírus, necessitam de tempo para serem digeridas. Mas arrisco algumas constatações preliminares.

O mundo está vivendo algo raro na história da humanidade. Talvez só se compare com a gripe espanhola na primeira metade do século XX. Diferente daquela pandemia, porém, a medicina nunca esteve tão preparada para enfrentar desafios.

Ao mesmo tempo, as autoridades estão se mostrando, de um modo geral, responsáveis com a ameaça invisível. O Governo do Brasil está adotando medidas emergenciais apropriadas na saúde e na economia.

Entretanto, o ser humano, que se diferencia do restante do mundo animal pela racionalidade, está agindo como manada. O pânico parece estar embaçando nossa inteligência.

Não, não estou falando de teorias conspiratórias. Tampouco desprezando a gravidade do momento. Eu e minha família estamos adotando medidas preventivas extras. Queremos todos ficar vivos.

Atendimento hospitalar na Itália – Reprodução: EuroNews

Falo de dados. Até o momento, cerca de 190 mil pessoas foram infectadas no mundo, de acordo com boletim da OMS do último dia 18 de março. O número de mortes, concentradas na China, Itália e Irã, se aproximava das 8 mil. No Brasil, segundo o site do Ministério da Saúde, também atualizado no dia 18, havia 428 casos registrados e 4 mortes confirmadas.

Algumas comparações com base em dados do portal G1. Apesar da queda de 14%, 3.739 mulheres foram assassinadas em 2019.

Mesmo com a redução de 19%, 41.635 indivíduos foram assassinados em 2019. Ou seja, houve 5 vezes mais assassinatos no Brasil em 2019 do que vítimas do vírus em todo o mundo.

Outra gripe recente, a H1N1, ou Influenza, matou em média duas pessoas por dia no Brasil em 2019 – foram registrados 796 óbitos. O Aedes aegypti matou, no mesmo ano, 754 pessoas no País.

O fato é que outras letalidades, mais agressivas, não decidiram parar de provocar vítimas e esperar o coronavírus desfilar solitário na passarela da morte. O jornalista Leonardo Sakamoto, do UOL, entrevistou quem entende do assunto.

Ministro Henrique Mandetta, da Saúde – Foto: Orlando Brito

Um desabafo de um médico socorrista abre sua coluna da última segunda, dia 16. “Acidentes de trânsitos, partos, afogamentos, quedas de laje, infartos não param de acontecer para esperar o coronavírus passar”.

Na China, onde tudo começou, em novembro de 2019, os casos estão em declínio acelerado. Prêmio Nobel, o biofísico Michael Levitt disse que “o Corona já está em se enfraquecendo, e a humanidade vai sobreviver”.

A vida continua

O que a maioria não está vendo é que haverá um dia seguinte. 2020 prometia ser um ano de recuperação econômica – o que, agora, parece muito difícil.

Uma recessão econômica já é uma possibilidade real. Ou seja, voltarmos aos fatídicos anos de 2015 e 2016, depois que o PT levou o País à bancarrota.

A vida de cada brasileiro é valiosa, mas o mundo não vai acabar depois que o coronavírus passar. As consequências de uma crise mal gerida podem durar um tempo muito maior do que a fase mais aguda da crise – 4 meses, talvez.

Vigilância sanitária no Aeroporto JK, na capital federal – Foto: Paulo Carvalho/Agência Brasília

Se combater o covid-19 é questão de sobrevivência, minimizar os efeitos deletérios na economia é igualmente necessário. Um remédio aplicado em dose excessiva vira veneno.

Se não dosarmos a receita, duas consequências são previsíveis. Aumento do desemprego e quebradeira, sobretudo de micro e pequenas empresas. O cenário próximo futuro pode ser o da depressão, com consequências muito mais duradouras.

O momento deve ser aproveitado para endireitar o País e corrigir injustiças históricas. Para começar, hora de aprofundar as reformas estruturais, como a PEC Emergencial, a 186.

Ao mesmo tempo, se precisamos de mais recursos para saúde, que tal cortar onde sobra gordura, como os R$ 2 bilhões do fundo eleitoral? Cálculo do professor do Insper, Thomas Conti, aponta que há R$ 4,7 bilhões desperdiçados em auxílio-moradia com a elite do Judiciário.

Segundo ele, outros R$ 5 bilhões vão para pensões de filhas de militares e R$ 10 bilhões ultrapassam o teto dos supersalários do serviço público. Uma vacina contra o desperdício é destinar esta montanha de dinheiro para quem realmente precisa.

* Mateus Bandeira foi CEO da Falconi, presidente do Banrisul e secretário de Planejamento do RS

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